Principais candidatos são comedidos na quantidade de postagens e pouco aprofundam o tema, mostra pesquisa da Vert Inteligência Digital, feita a pedido da Página22. Lula é quem mais posta e Bolsonaro adota tom panfletário. Saiba como se posicionam sobre temas ambientais sensíveis e as tragédias cada vez mais frequentes no País
Por Magali Cabral
[Foto: Marinelson Almeida/Flickr]
Se não há muitos motivos para celebrar o Dia Mundial do Meio Ambiente em um ano marcado até agora por uma coleção de tragédias e ilegalidades, que a efeméride seja útil para despertar a atenção dos brasileiros para o tema ambiental nas eleições de outubro. Como principais candidatos ou pré-candidatos à Presidência da República têm se posicionado sobre o assunto e como reagiram em suas redes sociais diante de grandes tragédias que assolaram o País nos últimos anos?
Essas manifestações virtuais se perdem com o tempo nas nuvens das mídias digitais e recuperá-las exige um esforço cibernético. Foi o que fez a Vert Inteligência Digital, que as reuniu no Observatório das Eleições – especial Meio Ambiente, a pedido da Página22 e aqui publicado com exclusividade. O mapeamento pode ajudar eleitores sensíveis ao tema ambiental, e ainda indecisos sobre suas escolhas políticas, a se posicionarem com mais assertividade nas próximas eleições.
Todos foram comedidos na quantidade de postagens nas redes sociais proprietárias sobre a importância da conservação do meio ambiente, assim como na profundidade do debate. Foram analisadas na pesquisa as redes Instagram e Twitter entre 1o de fevereiro a 1o de junho deste ano. Mas a pesquisa mostra que o candidato do PT, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, foi o que mais publicou, com 3 posts no Instagram e 12 no Twitter. O presidente Jair Bolsonaro, candidato à reeleição pelo PL, publicou 4 posts no Instagram e 3 no Twitter; o candidato do PDT, Ciro Gomes, fez 2 posts no Instagram e 7 no Twitter; e a senadora Simone Tebet, pré-candidata do MDB, postou 4 mensagens no Instagram e nenhuma no Twitter.
Lula compartilhou encontros com personalidades, como a princesa Marie-Esméralda Léopodine, o presidente da França Emmanuel Macron e Caetano Veloso, em que trata da questão climática e do desenvolvimento sustentável. Suas postagens trazem um conteúdo genérico. Em 7 de maio, ele diz no Twitter: “Cuidar do meio ambiente é, antes de tudo, cuidar das pessoas. Buscar a convivência entre o desenvolvimento econômico e o respeito à flora, à fauna e aos seres humanos. A transição para um novo modelo de desenvolvimento sustentável é um desafio planetário.” O ex-presidente também critica o atual governo, em 9 de fevereiro: “… Agora tem um governo que acha que tem que desmatar. Mas se a gente não respeitar o meio ambiente, teremos mais dificuldade de exportar. Cuidar da floresta é obrigação ambiental e econômica.”
Bolsonaro, na maioria das publicações deste ano, tem sido panfletário, isto é, não apresenta relação entre a informação trazida e a preservação do meio ambiente e faz uso das postagens para divulgar ações do governo. No Twitter, publica em 1o de junho: “Em mais uma rodada, o Governo Federal libera recursos para andamento de obras de saneamento básico em Minas Gerais, Pernambuco, Rondônia, Rio Grande do Sul e São Paulo. O objetivo é garantir a preservação do meio ambiente e a melhoria das condições de saúde das regiões.” No Instagram, o presidente relaciona obras do governo e compartilha meme para falar da visita de Elon Musk ao Brasil e das pautas que discutiram: internet para escolas rurais e monitoramento da Amazônia.
No encontro com Elon Musk, Bolsonaro diz que pretende usar a rede de satélites para mostrar que a Amazônia é preservada, e que o desmatamento ocorreria apenas em nichos. Os dados oficiais do Inpe mostram que o desmatamento em 2021 foi 75% maior do que o registrado em 2018.
O candidato Ciro Gomes usou as redes sociais este ano especialmente para tecer críticas às ações do governo federal em relação à pauta climática. Em entrevista à Ceo Conference 2022, promovida pelo Banco BTG Pactual, comenta sobre a importância do desenvolvimento sustentável para que o País volte a ter relevância no cenário internacional. “A questão do meio ambiente é central para o Brasil. Mas não vamos resolvê-la reprimindo populações inteiras que, até outro dia, eram estimuladas a desmatar. Temos de criar outras alternativas de sobrevivência para quem vive da floresta. Em suma, estabelecer o desenvolvimento sustentável como meta prioritária.” Ciro também usa o Twitter, em 21 de maio, para parabenizar a vereadora Duda Salabert (PDT-MG) por defender a Serra do Curral contra a mineração.
Simone Tebet usou duas de suas quatro publicações no Instagram para divulgar visitas que fez ao Bioparque Pantanal (MS) e a Belém do Pará. Nessas ocasiões, a candidata apenas comenta no post ter discutido pautas ambientais. Nas outras duas publicações os termos “meio ambiente” e “sustentabilidade” aparecem apenas como slogan de campanha.
Brumadinho na lama
Os quatro políticos compareceram às redes sociais para reagir à tragédia de Brumadinho (MG), ocorrida em 25 de janeiro de 2019, cujo rompimento da barragem B1 da Mina Córrego do Feijão, de responsabilidade da Vale, deixou 272 mortos, incluindo três desaparecidos, e causou sérios impactos, sobretudo, na bacia do Rio Paraopeba.
Em um post no Instagram, feito no primeiro aniversário da tragédia, em 25 de janeiro de 2020, Lula define o episódio como genocídio: “Um ano do crime de Brumadinho. Um ano da destruição de milhares de vidas afetadas por essa tragédia. Quando as pessoas só pensam em lucro, elas permitem genocídios como o que ocorreu em Brumadinho. Resultado da falta de fiscalização… Minha solidariedade a todas as famílias que sofrem com as dores de suas perdas.”
No dia da tragédia, Bolsonaro, no Twitter, lamenta o ocorrido e informa: “…Determinei o deslocamento dos Ministros do Desenvolvimento Regional e Minas e Energia, bem como nosso Secretário Nacional de Defesa Civil para a região.” Simone Tebet, também no Twitter, lamenta, no dia seguinte à tragédia, que “após 3 anos do desastre ambiental de Mariana, outro ‘mar de lama’ carregue vidas e deixe um rastro de vítimas e prejuízos ambientais, patrimoniais e emocionais.” E Ciro Gomes tuita: “As primeiras informações que nos chegam são de que o Brasil assiste a mais um vergonhoso desastre humano e ambiental em Minas Gerais…”
Pantanal em chamas
O que postaram os candidatos sobre o maior incêndio da história do Pantanal mato-grossense, entre agosto e setembro de 2020? Na ocasião, o fogo queimou cerca de 4 milhões de hectares (26% do bioma) e matou pelo menos 17 milhões de animais vertebrados, segundo levantamento realizado por pesquisadores de órgão públicos, universidades e organizações da sociedade civil.
Em 15 de setembro de 2020, Lula questiona no Twitter o porquê de as Forças Armadas não estarem com um grande contingente no Pantanal e na Amazônia. “…desmontaram todos os mecanismos de prevenção a incêndios. Esse ministro do Meio Ambiente [na época Ricardo Salles] é um cidadão sem caráter e sem respeito pela natureza.” Jair Bolsonaro usa o Twitter, no dia 18, para provocar a TV Globo. Publica as ações do governo no combate aos incêndios e ironiza: “Mais do que você não verá em certa emissora de TV sobre combate a incêndios”.
Simone Tebet posta em 6 de agosto no também Twitter: “O Pantanal está em chamas e pede socorro. Apresentei proposta para incluir o bioma no Conselho Nacional da Amazônia Legal, para que haja uma política coordenada de controle de queimadas”. Ciro Gomes não se manifesta sobre o tema em suas redes sociais.
Chuvas na Bahia e em Petrópolis
Entre novembro e dezembro de 2021, o Instituto Nacional de Meteorologia (INMET) registrou o maior volume de chuvas dos últimos 60 anos no estado da Bahia. Várias cidades foram engolidas pelas águas e a defesa civil registrou 26 vítimas fatais e milhares de desabrigados.
No Twitter , em 27 de dezembro, Lula comenta sua conversa com o governador baiano, Rui Costa. “….É importante e urgente que as Forças Armadas, com sua estrutura de enfrentamento de calamidades, atuem no apoio para as vítimas de enchentes. Sem nenhum tipo de veto político, mas sim para ajudar o povo da Bahia”.
Já Bolsonaro, em férias em Santa Catarina, posta no Twitter, em 29 de dezembro: “Continuamos [o governo] na Bahia”. Ciro Gomes se manifesta no Twitter no dia 26 de dezembro: “Fim de ano muito triste e difícil para a Bahia, com as chuvas intensas que vêm castigando o estado desde o início do mês. Eu quero deixar aqui toda minha solidariedade e apoio às muitas famílias que estão sofrendo com mais essa tragédia climática. Força aos baianos!”. Simone Tebet não faz nenhuma postagem.
Todos os candidatos também manifestaram solidariedade aos petropolitanos pela tragédia provocada pelas chuvas nos primeiros meses deste ano na cidade fluminense, em que 233 pessoas morreram e cerca de 600 ficaram desabrigadas.
Exploração em Terras Indígenas
O Observatório das Eleições 2022 fez também um levantamento na imprensa e nas redes sociais para reunir a opinião dos candidatos sobre a exploração de recursos em Terras Indígenas. O ex-presidente Lula defende a criação de um “revogaço” que reveja todos os decretos que tiram direitos indígenas e que encorajam o desmatamento. Ele também propõe a criação de um ministério que trate apenas de questões dos povos originários.
Bolsonaro, ao contrário, tem afirmado que, no que depender dele, não haverá mais demarcação. Para ele, todos os brasileiros devem ter os mesmos direitos e não custa nada explorar de forma racional grandes áreas como a Raposa Serra do Sol – área no norte de Roraima, demarcada em 2005.
Para Ciro Gomes, é preciso respeitar a cultura, os valores e a diversidade dos povos indígenas e entendê-los como parte apartada que precisa ser protegida territorialmente e espiritualmente.
O compromisso de Simone Tebet com os povos tradicionais brasileiros, conforme apuração do Observatório das Eleições, é dar a eles mais representatividade. Defensora de causas ruralistas, a senadora pede também ao governo agilidade na indenização de fazendeiros por terras que passaram para os indígenas.
Planos de governo
Bolsonaro ainda não apresentou formalmente suas propostas, mas, em seu discurso na Cúpula de Líderes sobre o Clima, em abril de 2021, afirmou que além de atingir a neutralidade climática até 2050, seu governo tem como compromissos reduzir emissões de gás carbônico do Brasil em 43% e eliminar o desmatamento ilegal até 2030 – metas assumidas em 2015, no Acordo de Paris. Mas, em dezembro do ano passado, o governo mudou o ano-base de cálculo aumentando, assim, a permissão de emissão dos poluentes em mais de quatrocentos milhões de toneladas, o que fiou conhecido como pedalada climática. O Acordo veda o que se chama de redução da ambição climática. Alm disso, críticos apontam que sua gestão na área tenha sido marcada por retrocessos e desmonte de órgãos de fiscalização.
Ele defende o desenvolvimento econômico da região Amazônica, inclusive da atividade de mineração, para supostamente combater a derrubada da floresta. O documento Projeto de Nação: o Brasil em 2035, criado pelos militares, com apoio do vice-presidente Hamilton Mourão, utilizou a estrutura atual dos ministérios para sua elaboração. Tudo indica, portanto, que ele deve servir como direcionamento para um eventual novo governo Bolsonaro. No plano de governo de Bolsonaro elaborado para as eleições de 2018, a única menção às palavras “meio ambiente” e “sustentável” estava no capítulo “Agricultura”.
Lula promete revogar medidas de devastação ambiental do governo Bolsonaro; acabar com o desmatamento ilegal, com especial atenção à Amazônia; preservar e regenerar a sociobiodiversidade; investir em economia da biodiversidade, infraestrutura verde e em iniciativas que acelerem a transição ecológica e energética; articular uma nova lei geral de licenciamento ambiental, mais eficiente e moderna; reconstruir o Plano Nacional de Recursos Hídricos e a Política Nacional de Resíduos Sólidos; fortalecer órgãos de combate a crimes ambientais.
Ciro Gomes tem afirmado sua intenção de reverter política atual para o Ibama, Inpe e Embrapa, aumentando efetivo e fiscalização; incumbir o Exército na atuação contra o desmatamento; integrar geradores de energia renovável ao sistema de distribuição energética; oferecer alternativas econômicas para a população amazônica, com incentivo ao beneficiamento do setor extrativista e racionalização do licenciamento de diversas culturas com valor econômico; promover o reflorestamento e enriquecimento do solo de áreas degradadas; incorporar métodos mais científicos ao manejo sustentável de florestas, ao uso da biodiversidade para fins farmacêuticos e ao aproveitamento do potencial hídrico, sem alagar grandes áreas.
A pré-candidata Simone Tebet ainda não apresentou formalmente suas propostas, mas defende combater grilagem e outros crimes ambientais; conciliar desenvolvimento sustentável do agronegócio com proteção ao meio ambiente. Segundo ela, o Brasil precisa cumprir obrigações ambientais assumidas em acordos internacionais, como Acordo de Paris para redução de emissões de carbono. A senadora apoia o fortalecimento dos órgãos de combate a crimes ambientais e defende mais investimentos em energia renováveis e etanol e biodiesel.
Metodologia
A coleta nas redes sociais proprietárias dos presidenciáveis foi realizada de 1o de fevereiro a 1o de junho deste ano. O posicionamento dos candidatos em desastres ambientais abarcou o período de 2019 a 2022. Plano de Governo: 2018 e 2022. Termos relacionados: 01/06/2021 a 01/06/2022 (total da coleta: 352 mil menções)
Redes sociais proprietárias analisadas: Instagram e Twitter.
Mídias digitais analisadas em mar aberto: Instagram, Twitter, Facebook, Youtube, além de blogs e sites de notícias.
As menções são públicas e liberadas via API de cada um dos sites. Para coleta e análise, foi utilizado o War Room, dentro da ferramenta de monitoramento Stilingue e o painel Vert de presidenciáveis na ferramenta Zeeng.
Linha do Tempo
A pesquisa ainda traçou uma linha do tempo desde 1972 – data da histórica Conferência de Estocolmo, celebrada hoje no encontro global Estocolmo+50