Jogos Olímpicos de Inverno na Rússia mostram-se contra-exemplo de legado de desenvolvimento de eventos esportivos
Hoje é dada a largada oficial para um dos mais controversos (e caros) megaeventos esportivos do século XXI. Os jogos Olímpicos de Inverno de Sochi são marcados por protestos de atletas e civis de todo o mundo contra a discriminação institucionalizada de LGBTs e outras inúmeras violações a direitos humanos. Apesar de menos repercutida, a destruição ambiental é um dos legados negativos mais preocupantes dos jogos, que alterou drasticamente as condições de vida em vários vilarejos da região.
Sochi é um balneário da região do Cáucaso, à beira do mar Negro, reconhecido como patrimônio natural e Reserva da Biosfera pela Unesco, devido à riqueza de suas paisagens e biodiversidades. Curiosamente, a região tem um dos climas mais quentes da Rússia. Assim que foi anunciada as Olímpiadas na cidade, organizações ambientalistas do mundo e da Rússia prontamente expressaram sua preocupação com o impacto ambiental gerado pelas obras.
Ativistas alegam que, sob o pretexto de acelerar as obras das Olimpíadas, as autoridades russas abriram uma brecha na legislação que permite a construção em áreas naturais protegidas. Segundo relatos de moradores de vilarejos nos arredores da cidade, o rio Mzymta, principal fonte de água potável da cidade, está sendo contaminado com toxinas advindas de milhares de depósitos irregulares de lixo, principalmente entulho das construções olímpicas.
Outro caso grave, narrado pela agência Reuters, acontece na vila de Akhshtyr, onde os poços que abasteciam os moradores secaram depois que a empresa estatal Russian Railways começou a escavar uma pedreira nas proximidades. Elas forneciam minerais usados nas obras de Sochi. Hoje eles dependem de caminhões-pipa trazidos pela própria empresa, o que alterou drasticamente suas possibilidades de subsistência.
Um vídeo da Human Rights Watch (disponível ao lado, em inglês ), ONG que tem feito intensa campanha contra as violações sociais e ambientais dos Jogos de Inverno, mostra os casos de famílias que foram forçadas a deixar suas casas. Entre elas, pessoas que percebem suas casas se moverem morro abaixo devido às alterações profundas no solo, provavelmente provocadas pelas obras e extração de recursos minerais no parque.
Apesar das evidentes violações, as organizações ambientalistas têm dificuldades em reverberar suas críticas por causa da repressão do governo russo. Segundo a Humans Rights Watch, ambientalistas têm sofrido constantes ameaças e repressão por seus trabalhos de denúncia e mobilização. O militante do movimento local Environmental Watch on North Caucasus, Evgeny Vitishko, foi detido esta semana acusado de “blasfêmia em publico”.
A enxurrada de acusações de irregularidades em Sochi – adicione-se à lista o salto dos custos dos Jogos de 12 para 50 bilhões de dólares – atinge também a reputação do Comitê Olímpico Internacional (COI), cobrado por militantes para que haja com assertividade junto aos governos das sedes dos eventos esportivos. A Human Rights Watch, por exemplo, pede que o COI pressione as autoridades russas para garantir a reparação dos danos causados ao meio ambiente e às comunidades, mesmo depois da realização dos Jogos. Na opinião da ativista Yevgenia Chirikova, os escândalos dos jogos olímpicos de Pequim e Sochi podem fazer com que países europeus hesitem em cooperar com o COI e repensem se vale a pena mesmo receber esses eventos em suas cidades: “os Jogos tornam-se cada vez menos uma celebração esportiva, e cada vez mais uma festa privada e uma amostra de determinas ambições por parte das autoridades”.
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