Conheça os ativistas que estão tomando ruas e praças, não com as usuais palavras de ordem, mas com ações diretas para a melhora do espaço público
Em 2008, Cecilia Lotufo se viu às voltas com um pedido desconcertante de sua filhinha, Alice, de 3 anos: a menina queria que seu quarto aniversário fosse comemorado na pracinha do lado de casa. O problema é que, como outras tantas praças paulistanas, aquela estava bem maltratada. Mas Cecilia arregaçou as mangas, juntou amigos e vizinhos e contatou a Subprefeitura de Pinheiros. No fim da história, não só Alice teve a festa que queria como a comunidade ganhou uma praça renovada . Foi assim que começou o Movimento Boa Praça.
Nesses sete anos, o movimento vem contribuindo com a manutenção de três praças de São Paulo e ajudou na criação de uma quarta. Pode não parecer um resultado tão empolgante, mas mostra que dá para, ao menos, trincar a espiral de degradação que aflige os espaços públicos. “Ninguém usa a praça porque ela está suja, ou a praça está suja porque ninguém usa?”, questiona Thais Mauad, que atua como voluntária no Boa Praça desde 2009. A teoria é que com uma ocupação ativa é possível trazer a população de volta e, assim, pressionar o poder público.
É batata!
Ecos desse pensamento reverberam, por exemplo, no esforço do coletivo A Batata Precisa de Você para tentar reativar o Largo da Batata. Tradicional ponto de comércio popular, entre 2007 e 2013 o largo sofreu uma grande intervenção. O resultado final – um enorme cimentado sem árvores ou mobiliário – deixou muita gente desapontada. “O Largo da Batata
sempre foi cheio de vida, aí a Prefeitura gastou milhões para criar um deserto”, observa o artista visual Raphael Franco, que participa do coletivo. A primeira ação, realizada em janeiro de 2014, foi plantar 32 árvores sem o aval da Prefeitura. De lá para cá, eles têm trabalhado continuamente para tornar o largo mais acolhedor, por meio da organização de uma programação cultural que inclui apresentações musicais, bailes, atividades esportivas e debates diversos. Até festa de casamento já rolou por lá.
Hortelões
As praças da cidade também são o hábitat mais comum dos Hortelões Urbanos, rede que estimula a criação de hortas coletivas – no último mapeamento eram, pelo menos, 25. Uma delas foi instalada há dois anos no Centro Cultural São Paulo (CCSP). “Era um espaço vazio e, agora, tem diversos usos”, comemora André Biazoti que coordena a horta do CCSP. “Temos gente cuidando da horta todos os dias.”
O ato de instalar hortas, segundo Biazoti, favorece a reestruturação de um sentimento comunitário, garantindo que isso traz reflexos positivos até para a segurança. Um indício está no fato de que, contra todas as probabilidades, o trabalho dos Hortelões quase nunca é alvo de vandalismo. “As hortas reativam memórias emocionais, trazendo um valor contemplativo que reverbera positivamente”. Essa convivência suave em ambientes tidos como ásperos parece ser uma constante. Raphael Franco também se surpreendeu com a falta de agressões contra o mobiliário urbano no Largo da Batata. “Achei que seria muito pior”, admite.
Psicanálise urbana
Ariel Kogan vê nessa ocupação criativa uma forma de desmontar o pavor que os habitantes das grandes cidades desenvolveram em relação aos espaços públicos por causa da violência urbana. Sua arma para isso é a gastronomia. Há cerca de um ano, ele e dois sócios fundaram o Los Mendozitos – adega sobre rodas que oferece vinhos da região argentina de Mendoza em São Paulo e Rio de Janeiro.
Para Ariel, ao repaginarem a comida de rua, os food trucks trouxeram de volta um público que já se havia conformado em viver confinado. “Você consegue aumentar o fluxo de pessoas e vira um ciclo. As pessoas perdem o medo e isso as torna ruas mais seguras”, diz, ressaltando que pesquisas apontam para uma correlação direta entre o nível de uso e a segurança nos espaços públicos.
A proposta do Instituto Mobilidade Verde vai em sentido parecido, apostando na instalação de parklets como uma estratégia para reconectar as pessoas à cidade e questionar a noção de que as ruas são para os carros. “A disponibilidade de espaços de convivência, descanso e permanência é um fator primordial para incentivar pessoas a caminharem mais pela cidade”, explica o presidente do instituto, Lincoln Paiva.
[:en]Conheça os ativistas que estão tomando ruas e praças, não com as usuais palavras de ordem, mas com ações diretas para a melhora do espaço público
Em 2008, Cecilia Lotufo se viu às voltas com um pedido desconcertante de sua filhinha, Alice, de 3 anos: a menina queria que seu quarto aniversário fosse comemorado na pracinha do lado de casa. O problema é que, como outras tantas praças paulistanas, aquela estava bem maltratada. Mas Cecilia arregaçou as mangas, juntou amigos e vizinhos e contatou a Subprefeitura de Pinheiros. No fim da história, não só Alice teve a festa que queria como a comunidade ganhou uma praça renovada . Foi assim que começou o Movimento Boa Praça.
Nesses sete anos, o movimento vem contribuindo com a manutenção de três praças de São Paulo e ajudou na criação de uma quarta. Pode não parecer um resultado tão empolgante, mas mostra que dá para, ao menos, trincar a espiral de degradação que aflige os espaços públicos. “Ninguém usa a praça porque ela está suja, ou a praça está suja porque ninguém usa?”, questiona Thais Mauad, que atua como voluntária no Boa Praça desde 2009. A teoria é que com uma ocupação ativa é possível trazer a população de volta e, assim, pressionar o poder público.
É batata!
Ecos desse pensamento reverberam, por exemplo, no esforço do coletivo A Batata Precisa de Você para tentar reativar o Largo da Batata. Tradicional ponto de comércio popular, entre 2007 e 2013 o largo sofreu uma grande intervenção. O resultado final – um enorme cimentado sem árvores ou mobiliário – deixou muita gente desapontada. “O Largo da Batata
sempre foi cheio de vida, aí a Prefeitura gastou milhões para criar um deserto”, observa o artista visual Raphael Franco, que participa do coletivo. A primeira ação, realizada em janeiro de 2014, foi plantar 32 árvores sem o aval da Prefeitura. De lá para cá, eles têm trabalhado continuamente para tornar o largo mais acolhedor, por meio da organização de uma programação cultural que inclui apresentações musicais, bailes, atividades esportivas e debates diversos. Até festa de casamento já rolou por lá.
Hortelões
As praças da cidade também são o hábitat mais comum dos Hortelões Urbanos, rede que estimula a criação de hortas coletivas – no último mapeamento eram, pelo menos, 25. Uma delas foi instalada há dois anos no Centro Cultural São Paulo (CCSP). “Era um espaço vazio e, agora, tem diversos usos”, comemora André Biazoti que coordena a horta do CCSP. “Temos gente cuidando da horta todos os dias.”
O ato de instalar hortas, segundo Biazoti, favorece a reestruturação de um sentimento comunitário, garantindo que isso traz reflexos positivos até para a segurança. Um indício está no fato de que, contra todas as probabilidades, o trabalho dos Hortelões quase nunca é alvo de vandalismo. “As hortas reativam memórias emocionais, trazendo um valor contemplativo que reverbera positivamente”. Essa convivência suave em ambientes tidos como ásperos parece ser uma constante. Raphael Franco também se surpreendeu com a falta de agressões contra o mobiliário urbano no Largo da Batata. “Achei que seria muito pior”, admite.
Psicanálise urbana
Ariel Kogan vê nessa ocupação criativa uma forma de desmontar o pavor que os habitantes das grandes cidades desenvolveram em relação aos espaços públicos por causa da violência urbana. Sua arma para isso é a gastronomia. Há cerca de um ano, ele e dois sócios fundaram o Los Mendozitos – adega sobre rodas que oferece vinhos da região argentina de Mendoza em São Paulo e Rio de Janeiro.
Para Ariel, ao repaginarem a comida de rua, os food trucks trouxeram de volta um público que já se havia conformado em viver confinado. “Você consegue aumentar o fluxo de pessoas e vira um ciclo. As pessoas perdem o medo e isso as torna ruas mais seguras”, diz, ressaltando que pesquisas apontam para uma correlação direta entre o nível de uso e a segurança nos espaços públicos.
A proposta do Instituto Mobilidade Verde vai em sentido parecido, apostando na instalação de parklets como uma estratégia para reconectar as pessoas à cidade e questionar a noção de que as ruas são para os carros. “A disponibilidade de espaços de convivência, descanso e permanência é um fator primordial para incentivar pessoas a caminharem mais pela cidade”, explica o presidente do instituto, Lincoln Paiva.