O país que mais investe em Ciência abriga dezenas de milhões de pessoas que acreditam em qualquer coisa – menos no que tem comprovação científica. É crescente o número de norte-americanos que renegam, por exemplo, o aquecimento global e as vacinas.
Uma pesquisa de opinião divulgada há poucos dias mostra que aumentou o número dos que duvidam das mudanças climáticas. Segundo o respeitado Pew Research Center for the People & the Press, que ouviu 1.500 adultos nas últimas semanas, apenas 57% reconhecem as evidências científicas nesse sentido – contra 71% em abril do ano passado. Pior: dentre os que reconhecem tais evidências, apenas 36% do total associam as mudanças climáticas às atividades humanas. Também caiu o número de entrevistados que consideram esse um problema relevante.
É uma conclusão surpreendente. Estudos que corroboram o progressivo aquecimento da Terra são divulgados quase que diariamente e a cobertura na Imprensa é expressiva, sobretudo às vésperas da cúpula de Copenhague. Então, como entender essa descrença? Um dos diretores do Pew Center, Michael Dimock, sugere que o público está mais preocupado com a crise econômica e com a reforma do sistema de saúde e acaba relegando as questões ambientais a um segundo plano. Alguns ambientalistas aventaram que a população é influenciada por campanhas de desinformação promovidas por setores que não querem que o Senado dos EUA aprove medidas de combate às emissões de gases estufa. Pessoalmente, acredito que uma parcela importante da população prefere dar as costas à Ciência.
Pesquisas anteriores do Pew Research Center já haviam indicado que a maioria dos norte-americanos não acredita na evolução das espécies e não sabe que elétrons são menores do que átomos. Assim, a ignorância quanto ao aquecimento global não é um fenômeno isolado.
O desprezo pelas evidências científicas também se revela na guerra que algumas celebridades estão travando contra a vacinação de crianças. A atriz e ex-coelhinha Jenny McCarthy, é uma das principais porta-vozes do movimento que tenta associar as inoculações a uma maior incidência de autismo. Uma fatia crescente da população lhe dá ouvidos, apesar de não haver comprovação nesse sentido. Artigo publicado na semana passada pela revista Wired afirma que as taxas de vacinação caíram em certas regiões do país a níveis tão baixos que algumas doenças infantis estão voltando com força.
“Em algumas comunidades – como a rica Marin County, na California, ao norte de San Franciso, quase 6% dos pais deixam de vacinar seus filhos. Ao contrário do que se poderia imaginar, o fenômeno ocorre sobretudo entre os que têm maior nível de instrução e riqueza”.
Um livro recente – Unscientific Americans
-, escrito por Chris Mooney e Sheril Kirshenbaum, discute justamente isto: a dificuldade que os cientistas têm de se comunicar com a população e o lamentável estado de analfabetismo científico, que influencia a tomada de decisões essenciais no mundo moderno, da clonagem e os transgênicos à educação dos nossos filhos. Os autores entendem que a culpa é das lideranças religiosas, do ensino de baixa qualidade e da mídia desinteressada pelo tema. Eles lembram que, de cada cinco horas de noticiário televisivo, apenas um minuto é dedicado à Ciência. Além disso, o número de jornais que reservam espaço para o tema ficou dois terços menor nos últimos 20 anos .
Daí, fica a pergunta: será que não é o caso de investir em campanhas emocionais, acessíveis e desconectadas do viés científico se quisermos atrair esta parte da opinião pública?