A CBPAK encontrou na fécula de mandioca a matéria-prima para fabricar embalagens totalmente biodegradáveis
Na culinária brasileira, a fécula de mandioca presta-se a um sem-número de aplicações – da tapioca ao pão de queijo, passando por biscoitos e bolos. Mas o engenheiro e ex-presidente de multinacional Cláudio Bastos enxergou a possibilidade de a nossa raiz mais tradicional oferecer algo além de guloseimas para o cafezinho da tarde.
Sensível à questão do lixo urbano desde que começou a buscar um negócio para empreender, no início dos anos 2000, Bastos passou a pesquisar o tema e se deparou com um movimento de busca por plásticos biodegradáveis – nos Estados Unidos, por exemplo, gigantes do setor químico começavam a produzir polímeros de base renovável e biodegradável, especialmente tendo o milho como matéria-prima.
Esse foi o embrião da CBPAK, empresa que produz embalagens biodegradáveis a partir da fécula de mandioca e revestimentos que permitem tornar produtos, como copos, mais resistentes à umidade. Foram necessários cinco anos de pesquisa e desenvolvimento, com investimentos do próprio bolso, para criar a tecnologia que permite usar a espuma da fécula da mandioca na produção de embalagens.
O primeiro desafio foi fazer com que o biopolímero, antes testado apenas em escala laboratorial, pudesse ser produzido industrialmente; na época não havia benchmarking no País para se espelhar. A solução veio com o desenvolvimento de máquinas automáticas de múltiplas estações (tecnologia de automação desenvolvida pela empresa) e, posteriormente, a concepção de um novo processo de aplicação de material impermeabilizante no sistema produtivo, o que trouxe ganhos de produtividade.
A CBPAK começou suas operações em São Carlos, no interior de São Paulo, produzindo inicialmente bandejas biodegradáveis e impermeabilizadas. A novidade só foi apresentada aos potenciais clientes, como indústrias de alimentos, redes de supermercados e produtores de orgânicos, em 2007, quando a CBPAK já havia obtido as patentes de sua tecnologia e maquinário próprio para produção em escala industrial. Curiosamente, um dos primeiros clientes foi uma companhia aérea, a WebJet, mais tarde adquirida pela Gol.
Uma das alavancas para o negócio, no mesmo ano, foi a entrada da BNDES Participações (BNDESPar) no quadro societário da empresa, com aporte de R$ 2 milhões em troca de 25,6% do capital social e um empréstimo de R$ 2,3 milhões para a compra de novos equipamentos. A CBPAK também recebeu fomento da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) e da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). Isso permitiu à empresa ganhar fôlego financeiro para produzir em maior escala e conquistar mais clientes.
Em 2010, Bastos recomprou o lote de ações pertencentes à BNDESPar, com o objetivo de fazer alterações em seu modelo de negócios. Transferiu a sede da empresa e a unidade industrial de São Carlos para o Rio de Janeiro, e passou a produzir, além de bandejas, também copos e embalagens customizadas (sob encomenda). Atualmente quer se firmar como uma empresa que produz não apenas embalagens, mas soluções ambientais de baixo carbono e resíduo zero, já que a matéria-prima é de fonte renovável e 100% compostável.
“O mercado vê as embalagens como commodities, pois os custos para o meio ambiente do descarte de materiais plásticos não estão computados no preço dos descartáveis”, diz Bastos. Na prática, enquanto o preço de um copo plástico varia entre R$ 0,05 e R$ 0,20, o copo de fécula de mandioca produzido pela CBPAK custa entre R$ 0,25 a R$ 0,35. Embora a diferença não pareça tão gritante, como as vendas são feitas em grandes volumes, muitos clientes optam pelos mais baratos – que na maior parte dos casos acabam sendo descartados no lixo comum, sem sequer passar pela reciclagem.
“O desafio da CBPAK para os próximos anos é conseguir monetizar o valor ambiental agregado dos nossos produtos”, explica o empresário. Com o estudo de ciclo de vida na mão, Bastos mostra um dos principais trunfos de suas embalagens, que é o sequestro de 3,74 gramas de CO2 [1] equivalente por copo produzido – o tradicional copo plástico emite 16 gramas de CO2 equivalente por unidade produzida.
[1] Para facilitar os cálculos, todos os gases de efeito estufa, entre eles o metano, são contabilizados ao equivalente em dióxido de carbono
Hoje os principais clientes da CBPAK são aqueles que incluíram a preocupação com sustentabilidade entre os pré-requisitos para a compra de produtos e contratação de serviços. Entre os principais estão Korin, Samarco Mineração, Raízen, GM do Brasil e, mais recentemente, a operação do Google no Brasil – que, afetada pela crise hídrica em São Paulo, passou a comprar cerca de 50 mil copos compostáveis por mês para sua sede; e a norueguesa Statoil, cuja sede está localizada em um edifício com certificação ambiental Leadership in Energy and Environmental Design (Leed) e tem metas para reduzir os resíduos gerados.
As qualidades ambientais dos produtos de fécula de mandioca são reconhecidas por empresas que já vislumbraram a tendência de precificação das externalidades ambientais, como o carbono
Os desafios para a empresa, porém, continuam grandes. Mesmo com capacidade para produzir mensalmente 2 milhões de embalagens, a CBPAK ainda opera com fluxo de caixa negativo – a expectativa é fechar 2015 com um faturamento de R$ 500 mil.
Uma das saídas para aumentar a escala será o mercado externo. Participante assídua de feiras no exterior, a CPBAK planeja começar a exportar a partir de 2016 e para isso já busca parceiros na Europa que queiram atuar em uma joint venture ou franquia industrial. “É difícil empreender com foco em inovação e sustentabilidade no Brasil, porque não há incentivos governamentais e falta educação ambiental para que se perceba o valor desse tipo de solução”, diz Bastos. Mas, no país que é o segundo maior produtor global da mandioca (Indonésia em primeiro), o que não falta é espaço e matéria-prima para crescer.
FICHA – CBPAK
Microempresa
Setor: Embalagens (biodegradáveis)
Faturamento 2015: R$ 250.000
Funcionários: 25
Fundação: 2002
Principais clientes: Korin, Google, Statoil, GM do Brasil, Samarco Mineração, Raízen, Café Três Corações, LSG Sky Chefs
O que faz: embalagens compostáveis fabricadas a partir de matéria-prima renovável, a fécula de mandioca
Inovação para a sustentabilidade: Criou e desenvolveu tanto as embalagens biodegradáveis quanto o maquinário para fabricá-las, em múltiplas estações e com uso de automação industrial e robótica As embalagens possuem como diferenciais competitivos, além da matéria-prima renovável, a termicidade (suportam temperaturas de menos 10 graus até 75 graus); a possibilidade de customização com corantes orgânicos, a retirada de carbono da atmosfera e redução dos resíduos gerados. Possui Análise de Ciclo de Vida
Potencial: Com capacidade para produzir 2 milhões de embalagens/mês, a empresa pode explorar novos segmentos e buscar o mercado externo, que é atento para as questões de sustentabilidade
Gestão: Ações de governança, como reuniões periódicas entre os sócios para tratar do planejamento estratégico; gestão de desempenho baseada no acompanhamento de indicadores relacionados a seus objetivos; gestão de pessoas que conta com equipe externa de consultores de RH; programa de premiação baseado em desempenho pessoal e coletivo
Solução ambiental de baixo carbono e resíduo zero: matéria-prima de fonte renovável e 100% compostável