A Joy Street, do Recife, cria plataformas de jogos digitais que podem melhorar a performance acadêmica dos alunos e diminuir a evasão escolar
O bairro do Recife, onde a capital pernambucana foi fundada, há 480 anos, é cenário do charmoso encontro da tradição com a modernidade. Em meio a monumentos e casarios tombados pelo patrimônio histórico, o Porto Digital [1] reúne mais de 200 empresas e se destaca pelo ambiente de inovação como estratégia de revitalização urbana. Na Rua da Guia, o prédio de uma antiga indústria gráfica, hoje Empresarial ITBC, mantém a fachada original e, no último andar, um terraço verde com vista para o mar é convidativo à troca de ideias. Um dos 50 empreendimentos de tecnologia lá abrigados, a Joy Street chama atenção pelo estilo descontraído. Trabalhar de bermuda e chinelo é algo comum entre os 39 funcionários, que têm acesso a manicure e massagista. Tatuagens e cabelos coloridos são bem-vindos. E, nas paredes, as palavras “aprendizagem”, “diversão” e “diálogo” retratam os conceitos que marcam o negócio, baseado em soluções para um dos principais desafios brasileiros: a educação.
[1] Nos últimos três anos, o parque tecnológico movimentou R$ 1 bilhão em negócios inovadores
O empreendimento tomou forma com a demanda apresentada pela Secretaria de Educação de Pernambuco, em 2007, para mudar os preocupantes números da evasão escolar [2]. Para especialistas, aprender tornou-se uma atividade pouco interessante e sem engajamento no País.
[2] No Brasil, de todos os estudantes que iniciam o Ensino Fundamental, apenas 41% o concluem
A estratégia do governo estadual centrou-se no desenvolvimento local de tecnologias para aproximar a escola da cultura digital e da linguagem dos jovens. Os gestores do Porto Digital articularam, então, a formação de uma equipe de experts juntando múltiplos perfis profissionais – da ciência da computação à psicologia cognitiva, design, desenvolvimento de games e engenharia de software.
A empresa especializou-se em plataformas de jogos digitais e interações sociais aplicadas à educação como ferramenta capaz de superar barreiras típicas de um paradigma de escola que parou no tempo. Os jovens deixavam de ir à aula para ficar jogando games em casa ou em lan houses, uma febre dez anos atrás, quando o crescimento da evasão foi diagnosticado”, afirma Diego Garcez, diretor de negócios da empresa recifense, cujo lema é a “aprendizagem como diversão”.
O primeiro produto, o Oje, voltado para a rede pública de ensino, tornou-se carro-chefe como plataforma estruturada em games e enigmas [3] que interagem com as diversas disciplinas escolares. Até o momento, a tecnologia beneficiou mais de 150 mil usuários nos estados de Pernambuco, Rio de Janeiro e Acre e do município de Aracaju (SE). Entre os diferenciais que renderam ao produto prêmios internacionais, como o European Seal of e-Excellence, está a navegação mais eficiente e produtiva para fins de pesquisa na internet, estimulando a leitura e a melhor interpretação de verbetes, com menor quantidade de cliques.
[3] Desafios inspirados na matriz de competências do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem)
“Conseguimos comprovar maior interesse e participação, inclusive dos professores, cujo vínculo com os esforços para a qualidade do ensino estava perdido”, ressalta Garcez, ex-integrante do Centro de Estudos e Sistemas Avançados do Recife (Cesar), que reúne desenvolvedores de games na Universidade Federal de Pernambuco.
Após o sucesso inicial, o passo seguinte foi diminuir a dependência de contratos com governos e desenvolver soluções para o Terceiro Setor e iniciativa privada. Dessa forma, como resultado de demandas educacionais como as dos institutos Telefônica e Natura, surgiu a plataforma Plinks, destinada a trabalhar Português e Matemática no Ensino Fundamental. Inspirado nas interações virtuais do Club Penguin [4], pertencente à Disney, o método tem como base um personagem que desbrava os encantos do planeta apresentando os conteúdos de forma lúdica.
[4] Jogo virtual on-line, voltado para crianças e adolescentes, com participação em massa de múltiplos usuários de várias partes do mundo
A empresa investe atualmente em um terceiro segmento de mercado: o ensino à distância, que faturou R$ 2,4 bilhões em 2014, absorvendo 25% das matrículas do ensino superior. Por meio da plataforma Apta, em fase de lançamento após investimento massivo nos últimos dois anos, o objetivo é desenvolver competências para o mercado de trabalho, melhorando práticas de cursos técnicos e profissionalizantes à distância.
O modelo inclui ferramentas como vídeos, hipertexto e quiz e pode ser adaptado sob demanda dos departamentos de recursos humanos para atividades de treinamento nas empresas. A Unilever, por exemplo, encomendou o produto para capacitar a força de venda. “Também o ensino à distância, disseminado nos últimos anos como alternativa à educação formal e às salas de aula enfadonhas, sofre hoje com a baixa qualidade e alta taxa de evasão”, explica Garcez.
Desafio, narrativa e aventura são pilares dos produtos educativos desenvolvidos pela Joy Street, que se diferencia como empresa de nicho, alicerçada no potencial interativo e lúdico da chamada gamificação [5], que permite índices de aprendizagem até duas vezes maior em relação a métodos convencionais, segundo estudos americanos.
[5] O mercado de jogos digitais movimentou cerca de R$ 5,2 bilhões em 2014 no Brasil, com 73 milhões de horas diárias de engajamento
Em 2015, a empresa recebeu injeção de R$ 2,5 milhões em capital de risco do fundo Criatec 2, gerido pela Bozano Investimentos, para expandir estratégias. O plano é aumentar o faturamento dos atuais R$ 5,5 milhões anuais para até R$ 40 milhões, em cinco anos. Para Garcez, “o segmento vive a transição entre o furor do modismo e a etapa da consolidação, na qual terá vantagem quem reunir mais experiência e domínio do conhecimento”.
Joy Street
www.joystreet.com.br
Pequena empresa
Setor: Educação
Faturamento em 2015: R$ 5,5 milhões
Funcionários: 39
Fundação: 2010
Principais clientes: Governo de Pernambuco, Prefeitura de Aracaju, Telefônica, Natura, Editora Saraiva, Instituto Ayrton Senna.
O que faz: Desenvolve plataformas de gamificação e ludicidade para transformar o ensino e a aprendizagem em algo mais engajador e desafiador, diminuindo as altas taxas de evasão e melhorando a performance acadêmica dos alunos.
Inovação para a sustentabilidade: A abordagem educativa está baseada em torneios e enigmas por meio de jogos de máximo engajamento, tematizados com conteúdos acadêmicos. Possui método autoral de design para educação, criado em interação com a Universidade Federal de Pernambuco. Além disso, desenvolve a interação social dos alunos e professores e dinâmicas com enredo que dá sentido à aprendizagem. Tem o desafio de atuar fortemente com crianças e jovens de escolas públicas que representam a base da pirâmide social. Assim, a empresa promove a inclusão de forma estruturada e colabora diretamente para a melhoria dos indicadores de aprendizagem.
Potencial: A empresa foi acelerada pela Endeavor e Artemisia e tem presença relevante no ecossistema do Porto Digital, no Recife. As plataformas digitais desenvolvidas pela empresa atingiram até hoje 150 mil jovens e 10 mil professores de 4.000 escolas, com alto poder de escala e replicação. Após receber capital do fundo Criatec 2, a estratégia é crescer por meio de investimento em marketing e vendas e novos canais de distribuição em território nacional.
Destaques da gestão: A empresa tem estrutura de governança auditada pela Ernst Young e aplica metodologia ágil de gestão de projetos e de desempenho, com acompanhamento de metas. A organização identifica e monitora os riscos (estratégico, operacional, financeiro reputacional e legal) e cumpre a legislação aplicável a seu negócio. O modelo pedagógico é sólido e baseado em metodologias reconhecidas internacionalmente.