Dinheiro nem sempre é o principal problema para alavancar projetos sustentáveis. A lacuna está muitas vezes na forma como o recurso é mobilizado. Os chamados arranjos pré-competitivos, que fortalecem os setores como um todo, são uma boa saída para a Amazônia
O market share da Amazônia brasileira atualmente representa apenas 0,17% do mercado global de produtos ligados à floresta, que é da ordem de US$ 298 milhões. Esse dado citado pelo professor Salo Coslovsky, da New York University, dá a dimensão do desafio que a bioeconomia brasileira encontra. Para transformar esse quadro, é preciso, antes de mais nada, pensar em formas de organizar os setores envolvidos com a economia da floresta, como afirma o pesquisador durante o painel Investimento em bioeconomia em florestas tropicais: experiências em outros continentes, realizado durante o Fórum de Inovação em Investimento na Bioeconomia Amazônica (F2iBAM).
“O Brasil, no caso do cacau, compete com a Costa do Marfim. Ou compete com o Vietnã, se o produto for a pimenta-do-reino. Com todo respeito a esses países, eles têm um Produto Interno Bruto menor do que o estado do Maranhão”, compara Coslovsky. Por isso, os chamados arranjos pré-competitivos, que fortalecem os setores como um todo, são uma boa saída para a Amazônia conseguir avançar na produção de itens que vão gerar renda e, ao mesmo tempo, manter a floresta em pé, na visão do pesquisador.
Segundo ele, ao estudar casos em países como Equador, Bolívia, Costa do Marfim e Vietnã, que conseguem se destacar em nível mundial na produção de alguns itens ligados à floresta, os produtores estão tendo acesso aos chamados recursos compartilhados. “Esses recursos não são nem públicos nem privados, mas estão no meio”, diz o pesquisador.
Os recursos compartilhados são aqueles voltados para um melhor entendimento do setor como um todo. “É preciso investir no conhecimento. Quem vai fazer a embalagem? Ou se preocupar com as normas de importação da União Europeia? Ou prospectar novos mercados?”, exemplifica.
Os dados de outros países, mostram, segundo Coslovsky, que existe algum tipo de arranjo, mesmo entre empresas competidoras, para ajudar todo o setor. “Claro que isso não é fácil. Mas, mesmo no Brasil, no caso da produção de frutas em Petrolina ou do café no Sudeste, os competidores juntam forças. Além do dinheiro, é necessário haver organização. A lacuna está muitas vezes na forma como o recurso é mobilizado”, diz,
A necessidade de transformar a economia dos produtores que estão em regiões florestais, como também ocorre na África, é um ponto central na discussão que se tem hoje, concorda Teodyl Nkuintchua, da ONG WRI África. “Nossas observações feitas durante os últimos 20 anos mostram que ainda não temos um conceito real de bioeconomia principalmente na área da Bacia do Congo”. Trata-se de uma região que perdeu 7,3% de cobertura vegetal desde os anos 2000, segundo os dados apresentados durante o painel. Por isso, ações que envolvam responsabilidade política são de fundamental importância hoje, segundo Nkuintchua. “Precisamos entrar na fase de reorganização dos negócios. Já temos muitos esforços vindos do nível local.”
Duas fontes de renda
Um dos problemas na África e em vários países do mundo é a falta constante de recursos. Entretanto, Christopher Brett, especialista em agricultura do Banco Mundial, conta que o setor que ele administra empresta US$ 3 bilhões por ano aos governos de vários países. A principal linha de crédito disponível atualmente envolve práticas modernas que aumentam a produção para diminuir a fome no mundo, mas sem destruir o meio ambiente nem contribuir para o aumento da emissão de gases de efeito estufa. “O agricultor do futuro – isso já ocorre em alguns lugares, como na Costa do Marfim, com os produtores de cacau –, é aquele que terá duas fontes de renda. A proveniente da própria produção e uma outra que virá de recompensas por ter diminuído o desmatamento”, diz Brett.
Um dos programas principais do banco voltado à produção agrícola abrange oito commodities: carne bovina, cacau, milho, café, óleo de palma, arroz, soja e trigo. Existem projetos em dezenas de países, inclusive no Cerrado brasileiro com a carne e a soja. No Brasil, os investimentos pretendem melhorar as práticas de produção em 150 mil hectares de soja e 350 mil hectares de pasto.
A seguir, as sistematizações gráficas do painel:
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