Como ensinar uma geração que rejeita as estruturas de poder, é movida a desafios, quer (e faz) tudo ao mesmo tempo agora?
A cada novo bebê nascido, é comum ouvir exclamações deste tipo: “Como ele é esperto!” A criança cresce um pouco, e novas surpresas com sua evolução pipocam da boca dos mais velhos: “Ele está falando tudo!” Essa qualidade é, na verdade, uma condição inerente ao desenvolvimento intelectual da espécie humana, em contínuo progresso, mas que tem sido acelerado nos últimos 40 anos, devido aos maiores estímulos proporcionados pelo meio em que vivemos, conforme atestam pesquisas do Massachusetts Institute of Technology e estudos de neurociência realizados em vários países.
Especialmente dos anos 80 para cá, o mundo ficou mais complexo, mais “rápido”, a tecnologia sofisticou-se e entrou de vez na vida privada. Houve uma revolução nas estruturas familiares e mais do que nunca a mulher passou a levar dinheiro para casa e a chefiar famílias. E os filhos? Tiveram que se organizar sozinhos, já que seus pais estavam trabalhando fora. Nascidos com o controle remoto na mão, adquiriram intimidade com a tecnologia, assumiram novas maneiras de se relacionar, fugazes e mais práticas, e com muita gente ao mesmo tempo. Desenvolveram múltiplas atividades e foram levados a pensar e a agir de maneira multifacetada.
Quem nunca presenciou um adolescente em frente ao computador, fone de ouvido plugado, o olho na TV, participando de três ou quatros chats simultâneos e, ainda, fazendo o trabalho da escola? Com tantos estímulos, é fácil imaginar que qualquer coisa que se prolongue por um tempo, digamos, médio, cause tédio.
Estamos falando da Geração Y, denominação dada à turma nascida entre 1980 e 2000 que, além do chip adicional, veio com uma pergunta na ponta da língua: por quê? (Em inglês, why, pronúncia similar à da letra Y). Nada funciona se não houver uma razão, um motivo lógico que faça sentido. Isso vale tanto para um aprendizado novo como para relacionamentos pessoais. E o que não faz sentido eles simplesmente ignoram e passam para outra.
Muito dessa autonomia e visão clara e prática da vida tem a ver com o acesso ao gigante universo da informação. E a porta dele está escancarada para quem domina ferramentas tecnológicas de pesquisa. No mundo onde se valoriza mais a informação do que a sabedoria, eles sentem que têm o poder. Então, para que se submeter a relações hierárquicas, baseadas em privilégios, se o mundo é livre e vasto como a web, se todos somos iguais perante o conhecimento horizontalizado e temos liberdade de nos manifestar abertamente nos canais virtuais?
Acostumados à liberdade de expressar opinião, à transparência, ao compartilhamento de informação e a um alto nível de igualdade nas relações humanas, eles toleram pouco o que os reprime. “Nas gerações anteriores, a hierarquia era trazida pela família, pela escola e pelos poderes militares, e encerrava em si o conceito de respeito. Mas ele mudou muito, na medida em que a relação de igualdade entre pais e filhos e irmãos hoje é estimulada”, explica Carlos Alberto Simões Barreiro, diretor da Tailor Made, empresa de gestão de desempenho humano. Medo já não significa respeito.
Se não há mais esse tipo de barreira para superar, o que move então essa geração? Desafio, a matéria-prima que dá sentido à vida, seja para desvendar um programa de informática, seja para compreender o destino da humanidade.
Novos paradigmas, velhas estruturas
Barreiro acredita que nosso sistema educacional ainda está muito lento e atrasado para atender as novas demandas. “A formação dos profissionais da educação sofreu muito poucas mudanças nos últimos anos e as que houveram estão voltadas mais para aspectos estruturais do que conceituais”, diz. “Os professores considerados especialistas não recebem nenhuma formação em educação para entender os processos de aprendizado, e possuem baixa competência em termos de relacionamento interpessoal. As universidades não preparam os profissionais no sentido humano.”
Na sala de aula, o professor já não é mais o centro das atenções. Ele não detém o poder porque tem conhecimento. Seu papel, hoje em dia, é o de um mediador de conhecimento e relações humanas. E uma das formas pelas quais esse processo tem acontecido é a motivação. O professor precisa instigar os alunos com atividades baseadas na indução, a fim de ensinar um novo conteúdo. O caminho é deixar que os alunos pratiquem, usem e encontrem o significado daquilo tudo. A regra por si só não vale nada.
“Uma boa aula é aquela em que o conteúdo está dividido em pequenos projetos com resultados muito visíveis e de curto prazo, pois é desinteressante um aprendizado de longo prazo e acumulativo. O aluno sente necessidade de fazer algo o tempo todo”, conta Steven Beggs, diretor da escola de idiomas Seven.
Para Barreiro, trabalhar a atenção é o grande desafio, uma vez que esta geração não tem grande poder de concentração na teoria: aprende mais pela prática. “Essa turma possui alta capacidade de relacionamento, por isso a educação deve promover o aprendizado em grupo”, diz.
Nas salas de aula da Seven Idiomas, os professores já perceberam que o aprendizado se dá pela troca com outras pessoas, mais do que pelo conteúdo em si. “Quando ela se rompe, não tem mais aprendizado”, conta Beggs. Por isso, o professor deve demonstrar real interesse pela vida pessoal do aluno, promover um encontro enriquecedor e uma aula motivante. Isso porque o respeito e a consideração não estão mais baseados no medo e no poder da autoridade. E as mudanças não acabam por aí.
O feedback que o professor dá ao aluno ao final de um projeto precisa ser, via de regra, o mais estimulante e positivo possível. “Ele deve ouvir o que precisa melhorar, mas só a crítica não funciona”, conta Beggs. De fato, essa motivação ajuda a juventude a enfrentar os pepinos de um mundo cheio de dívidas acumuladas pelas gerações anteriores com mais disposição em solucionar problemas, e por meio de decisões mais assertivas.
Mais verde, menos tela
Há quem diga que a Geração Y nasceu ambientalista. Pelo Google Earth fica fácil ver o avanço dos desmatamentos ao redor do mundo e perceber que a coisa vai mal. De fato, é crescente o número de jovens engajados em movimentos ambientais, muitos deles construídos nas redes virtuais da vasta web. Se, por um lado, esse envolvimento prepara uma turma sempre pronta para soltar o verbo, por outro, tem prejudicado a sua já frágil concentração. O futurista americano Richard Louv, autor de Last Child in the Woods, cunhou o termo “transtorno de déficit de natureza” para explicar que crianças e jovens que são privados do contato com a natureza têm mais distúrbios de comportamento, mais ansiedade e depressão e menor autoestima. De acordo com Louv, a vivência na natureza pacifica a criança e a prepara para enfrentar com mais resiliência as situações de estresse.
Para a bióloga Rita Mendonça, diretora do Instituto Romã, a atenção voltada para a tecnologia rouba o contato e a atenção que damos à natureza. “Pela tela do computador, vivemos algo pela imaginação, enquanto a natureza tem o poder de acalmar e esvaziar nossa mente.” Para Rita, essa geração de atenção dispersa é “sabida” em termos de informação, mas carente no conhecimento das próprias emoções. “Para todo avanço que fazemos em direção ao mundo externo, precisamos fazer o caminho para dentro. Está faltando introspecção e isso tem gerado adultos infantilizados e envolvimentos superficiais”, explica.[:en]
Como ensinar uma geração que rejeita as estruturas de poder, é movida a desafios, quer (e faz) tudo ao mesmo tempo agora?
A cada novo bebê nascido, é comum ouvir exclamações deste tipo: “Como ele é esperto!” A criança cresce um pouco, e novas surpresas com sua evolução pipocam da boca dos mais velhos: “Ele está falando tudo!” Essa qualidade é, na verdade, uma condição inerente ao desenvolvimento intelectual da espécie humana, em contínuo progresso, mas que tem sido acelerado nos últimos 40 anos, devido aos maiores estímulos proporcionados pelo meio em que vivemos, conforme atestam pesquisas do Massachusetts Institute of Technology e estudos de neurociência realizados em vários países.
Especialmente dos anos 80 para cá, o mundo ficou mais complexo, mais “rápido”, a tecnologia sofisticou-se e entrou de vez na vida privada. Houve uma revolução nas estruturas familiares e mais do que nunca a mulher passou a levar dinheiro para casa e a chefiar famílias. E os filhos? Tiveram que se organizar sozinhos, já que seus pais estavam trabalhando fora. Nascidos com o controle remoto na mão, adquiriram intimidade com a tecnologia, assumiram novas maneiras de se relacionar, fugazes e mais práticas, e com muita gente ao mesmo tempo. Desenvolveram múltiplas atividades e foram levados a pensar e a agir de maneira multifacetada.
Quem nunca presenciou um adolescente em frente ao computador, fone de ouvido plugado, o olho na TV, participando de três ou quatros chats simultâneos e, ainda, fazendo o trabalho da escola? Com tantos estímulos, é fácil imaginar que qualquer coisa que se prolongue por um tempo, digamos, médio, cause tédio.
Estamos falando da Geração Y, denominação dada à turma nascida entre 1980 e 2000 que, além do chip adicional, veio com uma pergunta na ponta da língua: por quê? (Em inglês, why, pronúncia similar à da letra Y). Nada funciona se não houver uma razão, um motivo lógico que faça sentido. Isso vale tanto para um aprendizado novo como para relacionamentos pessoais. E o que não faz sentido eles simplesmente ignoram e passam para outra.
Muito dessa autonomia e visão clara e prática da vida tem a ver com o acesso ao gigante universo da informação. E a porta dele está escancarada para quem domina ferramentas tecnológicas de pesquisa. No mundo onde se valoriza mais a informação do que a sabedoria, eles sentem que têm o poder. Então, para que se submeter a relações hierárquicas, baseadas em privilégios, se o mundo é livre e vasto como a web, se todos somos iguais perante o conhecimento horizontalizado e temos liberdade de nos manifestar abertamente nos canais virtuais?
Acostumados à liberdade de expressar opinião, à transparência, ao compartilhamento de informação e a um alto nível de igualdade nas relações humanas, eles toleram pouco o que os reprime. “Nas gerações anteriores, a hierarquia era trazida pela família, pela escola e pelos poderes militares, e encerrava em si o conceito de respeito. Mas ele mudou muito, na medida em que a relação de igualdade entre pais e filhos e irmãos hoje é estimulada”, explica Carlos Alberto Simões Barreiro, diretor da Tailor Made, empresa de gestão de desempenho humano. Medo já não significa respeito.
Se não há mais esse tipo de barreira para superar, o que move então essa geração? Desafio, a matéria-prima que dá sentido à vida, seja para desvendar um programa de informática, seja para compreender o destino da humanidade.
Novos paradigmas, velhas estruturas
Barreiro acredita que nosso sistema educacional ainda está muito lento e atrasado para atender as novas demandas. “A formação dos profissionais da educação sofreu muito poucas mudanças nos últimos anos e as que houveram estão voltadas mais para aspectos estruturais do que conceituais”, diz. “Os professores considerados especialistas não recebem nenhuma formação em educação para entender os processos de aprendizado, e possuem baixa competência em termos de relacionamento interpessoal. As universidades não preparam os profissionais no sentido humano.”
Na sala de aula, o professor já não é mais o centro das atenções. Ele não detém o poder porque tem conhecimento. Seu papel, hoje em dia, é o de um mediador de conhecimento e relações humanas. E uma das formas pelas quais esse processo tem acontecido é a motivação. O professor precisa instigar os alunos com atividades baseadas na indução, a fim de ensinar um novo conteúdo. O caminho é deixar que os alunos pratiquem, usem e encontrem o significado daquilo tudo. A regra por si só não vale nada.
“Uma boa aula é aquela em que o conteúdo está dividido em pequenos projetos com resultados muito visíveis e de curto prazo, pois é desinteressante um aprendizado de longo prazo e acumulativo. O aluno sente necessidade de fazer algo o tempo todo”, conta Steven Beggs, diretor da escola de idiomas Seven.
Para Barreiro, trabalhar a atenção é o grande desafio, uma vez que esta geração não tem grande poder de concentração na teoria: aprende mais pela prática. “Essa turma possui alta capacidade de relacionamento, por isso a educação deve promover o aprendizado em grupo”, diz.
Nas salas de aula da Seven Idiomas, os professores já perceberam que o aprendizado se dá pela troca com outras pessoas, mais do que pelo conteúdo em si. “Quando ela se rompe, não tem mais aprendizado”, conta Beggs. Por isso, o professor deve demonstrar real interesse pela vida pessoal do aluno, promover um encontro enriquecedor e uma aula motivante. Isso porque o respeito e a consideração não estão mais baseados no medo e no poder da autoridade. E as mudanças não acabam por aí.
O feedback que o professor dá ao aluno ao final de um projeto precisa ser, via de regra, o mais estimulante e positivo possível. “Ele deve ouvir o que precisa melhorar, mas só a crítica não funciona”, conta Beggs. De fato, essa motivação ajuda a juventude a enfrentar os pepinos de um mundo cheio de dívidas acumuladas pelas gerações anteriores com mais disposição em solucionar problemas, e por meio de decisões mais assertivas.
Mais verde, menos tela
Há quem diga que a Geração Y nasceu ambientalista. Pelo Google Earth fica fácil ver o avanço dos desmatamentos ao redor do mundo e perceber que a coisa vai mal. De fato, é crescente o número de jovens engajados em movimentos ambientais, muitos deles construídos nas redes virtuais da vasta web. Se, por um lado, esse envolvimento prepara uma turma sempre pronta para soltar o verbo, por outro, tem prejudicado a sua já frágil concentração. O futurista americano Richard Louv, autor de Last Child in the Woods, cunhou o termo “transtorno de déficit de natureza” para explicar que crianças e jovens que são privados do contato com a natureza têm mais distúrbios de comportamento, mais ansiedade e depressão e menor autoestima. De acordo com Louv, a vivência na natureza pacifica a criança e a prepara para enfrentar com mais resiliência as situações de estresse.
Para a bióloga Rita Mendonça, diretora do Instituto Romã, a atenção voltada para a tecnologia rouba o contato e a atenção que damos à natureza. “Pela tela do computador, vivemos algo pela imaginação, enquanto a natureza tem o poder de acalmar e esvaziar nossa mente.” Para Rita, essa geração de atenção dispersa é “sabida” em termos de informação, mas carente no conhecimento das próprias emoções. “Para todo avanço que fazemos em direção ao mundo externo, precisamos fazer o caminho para dentro. Está faltando introspecção e isso tem gerado adultos infantilizados e envolvimentos superficiais”, explica.