Poucos sabem que a eugenia – o desejo de criar uma sociedade em que todos seriam belos, fortes e inteligentes – foi, por muito tempo, promovida ativamente pelo governo dos Estados Unidos. Ela era tremendamente popular na virada do século XX, antes mesmo da eclosão da Segunda Guerra e da Solução Final proposta por Hitler. Os presidentes Theodore Roosevelt e Calvin Coolidge – bem como, do outro lado do Atlântico, o naturalista Charles Darwin e o inventor do telefone, Alexander Graham Bell – eram entusiastas da idéia de dar uma mãozinha para um suposto aprimoramento humano.
Vários estados americanos encamparam a eugenia e esterilizaram dezenas de milhares de indivíduos que viviam em asilos do governo e tinham inteligência considerada abaixo da média. Num episódio famoso, em 1927, a Suprema Corte dos EUA aprovou a esterilização de Carrie Buck, uma deficiente intelectual de 17 anos, filha de uma mulher nas mesmas condições e mãe de um bebê que recebera o mesmo diagnóstico. O veredito: “três gerações de idiotas são mais que suficientes”. Os Estados Unidos também limitaram a imigração de populações que consideravam geneticamente indesejáveis e desenvolveram programas para encorajar casais saudáveis a se reproduzirem.
Um documentário produzido há quatro anos pela rede de TV CBS, baseado no livro “State Boys Rebellion”, de Michael D’Antonio, ilustra o funcionamento dessa eugenia de estado. Ele conta como a Fernald State School, um dos primeiros orfanatos públicos especializados em crianças com deficiências intelectuais, converteu-se num depósito que chegou a ter 2.500 alunos, muitos deles perfeitamente dentro da norma. Mas o Estado não sabia o que fazer com eles e, ademais, a escola precisava de mão-de-obra grátis para plantar alimentos e fazer os servicos de limpeza e manutenção. Transformada em depósito humano, ela era palco de toda sorte de abusos, inclusive o uso dos jovens como cobaias de experiências científicas. Nos anos 20, o reformatório era considerado um modelo de sucesso pelos eugenistas americanos, o melhor dentre 100 instituições no gênero em todo o país.
“Pensamos, por muito tempo, que nós pertencíamos àquele lugar, que não pertencíamos à espécie [humana]”, relatou à CBS Fred Boyce, que chegou à Fernald em 1949, aos oito anos, quando sua mãe adotiva morreu, e ali ficou por 11 anos. “Pensávamos que nunca deveríamos ter nascido”.
O pesquisador D’Antonio estima que pelo menos a metade dos internos funcionariam bem no mundo atual. Mesmo assim, tinham acesso a apenas a um mínimo de educação, revendo as mesmas lições durante cinco, seis anos seguidos. Além disso, em 1994 foi divulgado que pesquisadores do Massachusetts Institute of Technology, o MIT, forneceram mingau irradiado para os garotos num estudo nutricional encomendado pela Aveia Quacker. Um grupo de ex-internos acabou conseguindo uma pequena indenização, paga pela empresa, o MIT e o governo. Nada que compensasse, mesmo remotamente, a experiência de passar pela Fernald.[:en]
Poucos sabem que a eugenia – o desejo de criar uma sociedade em que todos seriam belos, fortes e inteligentes – foi, por muito tempo, promovida ativamente pelo governo dos Estados Unidos. Ela era tremendamente popular na virada do século XX, antes mesmo da eclosão da Segunda Guerra e da Solução Final proposta por Hitler. Os presidentes Theodore Roosevelt e Calvin Coolidge – bem como, do outro lado do Atlântico, o naturalista Charles Darwin e o inventor do telefone, Alexander Graham Bell – eram entusiastas da idéia de dar uma mãozinha para um suposto aprimoramento humano.
Vários estados americanos encamparam a eugenia e esterilizaram dezenas de milhares de indivíduos que viviam em asilos do governo e tinham inteligência considerada abaixo da média. Num episódio famoso, em 1927, a Suprema Corte dos EUA aprovou a esterilização de Carrie Buck, uma deficiente intelectual de 17 anos, filha de uma mulher nas mesmas condições e mãe de um bebê que recebera o mesmo diagnóstico. O veredito: “três gerações de idiotas são mais que suficientes”. Os Estados Unidos também limitaram a imigração de populações que consideravam geneticamente indesejáveis e desenvolveram programas para encorajar casais saudáveis a se reproduzirem.
Um documentário produzido há quatro anos pela rede de TV CBS, baseado no livro “State Boys Rebellion”, de Michael D’Antonio, ilustra o funcionamento dessa eugenia de estado. Ele conta como a Fernald State School, um dos primeiros orfanatos públicos especializados em crianças com deficiências intelectuais, converteu-se num depósito que chegou a ter 2.500 alunos, muitos deles perfeitamente dentro da norma. Mas o Estado não sabia o que fazer com eles e, ademais, a escola precisava de mão-de-obra grátis para plantar alimentos e fazer os servicos de limpeza e manutenção. Transformada em depósito humano, ela era palco de toda sorte de abusos, inclusive o uso dos jovens como cobaias de experiências científicas. Nos anos 20, o reformatório era considerado um modelo de sucesso pelos eugenistas americanos, o melhor dentre 100 instituições no gênero em todo o país.
“Pensamos, por muito tempo, que nós pertencíamos àquele lugar, que não pertencíamos à espécie [humana]”, relatou à CBS Fred Boyce, que chegou à Fernald em 1949, aos oito anos, quando sua mãe adotiva morreu, e ali ficou por 11 anos. “Pensávamos que nunca deveríamos ter nascido”.
O pesquisador D’Antonio estima que pelo menos a metade dos internos funcionariam bem no mundo atual. Mesmo assim, tinham acesso a apenas a um mínimo de educação, revendo as mesmas lições durante cinco, seis anos seguidos. Além disso, em 1994 foi divulgado que pesquisadores do Massachusetts Institute of Technology, o MIT, forneceram mingau irradiado para os garotos num estudo nutricional encomendado pela Aveia Quacker. Um grupo de ex-internos acabou conseguindo uma pequena indenização, paga pela empresa, o MIT e o governo. Nada que compensasse, mesmo remotamente, a experiência de passar pela Fernald.