Cantar uma garota na rua é errado? Deveria ser crime?
Acabou no sábado a primeira Semana Internacional contra o Assédio de Rua, organizado por uma entidade chamada Stop Street Harassment, criada há quatro anos por Holly Kearl, militante especializada no tema e autora de um livro a respeito. Em uma dezena de países, foram promovidos eventos de porte um tanto tímido, compatível com a novidade da campanha. Palestras, apresentação de filmes, debates, cursos de auto-defesa e pequenas manifestações visavam transmitir a mensagem de que cantadas são invasivas, ofensivas e comprometem o direito de ir e vir da mulher. Na ampla definição de Holly, o assédio de rua inclui atos muito variados, de assobios, “secadas” e comentários (que podem ser barra pesada – ou não) à masturbação pública e o contato físico forçado.
Este vídeo ao lado, que recebeu quase 200 mil visitas nos últimos sete dias, é a parte mais vistosa da campanha. Nele, homens de todos os tipos, jeitos e cores criticam quem passa cantadas.
Francamente, não sei o que pensar disto tudo – e gostaria de discutir com vocês o mérito dessa campanha.
Nos meus anos, por assim dizer, de glória, eu fui razoavelmente cantada. Sempre achei que um bom xaveco é como um presente inesperado. Fazia cara de durona e não olhava para trás, mas saia de cena com um calorzinho interno e a certeza de que alguém, ainda que fosse um sujeito bisonho, me achava demais.
Também passei por episódios violentos (ou que poderiam ser violentos), mas que entram numa categoria completamente diferente de assédio de rua. Como a vez em que, aos 10 anos, um carro parou ao meu lado e um sujeito me perguntou se eu sabia a diferença entre homem ou mulher (eu sabia, claro – mulher não aborda criança na rua com um tópico desses) -, mas saí correndo. Ou outra vez em que dois homens correram atrás de mim, sem conseguir me alcançar, às 11 da noite, perto da minha casa. Ou outra, quando um sujeito fez o mesmo – e conseguiu me agarrar e levantar meu vestido, mas era dia e os vizinhos me acudiram rápido. Ou, por fim, esta outra, quando visitava o templo de Karnak, no Egito, e fui abordada por dois pegajosos que queriam aparecer numa foto comigo e estenderam a câmera para meu então namorado. Enquanto ele clicava, tive de escapar da mão boba de um dos fotogênicos.
Sim, foram episódios horríveis e que poderiam ter acabado mal. Mas será que dá para botá-los no mesmo pacote que inclui assobios e gritos de “gostosa”? Como diria o Sílvio Santos, quero consultar os universitários:
Cantada é mesmo uma prática misógena, como diz um dos sujeitos filmados? É um insulto à mulher abordada – ou apenas uma prática pouco refinada, meio adolescente e inconsequente? Qual a chance de ver uma cantada degenerar em estupro, por exemplo, ou numa agressão verbal (“muito orgulho, vira bagulho!”)?
Não seria essa campanha mero reflexo do politicamente correto excessivo que grassa nos Estados Unidos? Será que essa mistura de alhos e bugalhos não acaba criando uma patrulha que mais atrapalha que ajuda?
Alguma contribuição?