País defenderá recursos para conservação de florestas tropicais e lidera esforços para limitar aumento da temperatura global
Por Renato Grandelle
Tradicional articulador nas negociações climáticas, o Brasil chegará à Conferência das Partes das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP 29), que ocorrerá nas próximas duas semanas em Baku, no Azerbaijão, com uma pauta ambiciosa. A delegação nacional pretende angariar apoio a um fundo bilionário para a conservação de florestas tropicais e se empenhará em manter vivo um dos principais objetivos do Acordo de Paris: limitar o aumento da temperatura média do planeta a 1,5 grau Celsius, esforço batizado de Missão 1,5.
As baixas expectativas internacionais em relação à COP 29 preocupam o Brasil, já que o País sediará o encontro do ano que vem e, nesta posição, terá de assumir a continuidade das negociações que não forem concluídas em Baku. A prioridade da cúpula será a definição de uma nova meta coletiva de financiamento climático, que substituirá o atual compromisso dos países desenvolvidos de prover US$ 100 bilhões anuais às nações em desenvolvimento.
Além de ser defensor incondicional de um financiamento mais ambicioso à ação climática, o Brasil destaca que o recebimento de recursos não deve aumentar o endividamento das nações em desenvolvimento. O País também busca mais clareza sobre quais atividades devem ser efetivamente contabilizadas como um envio de investimentos. Embora acompanhe o tema de perto, a tendência é que o Brasil assume uma postura mais discreta nas discussões em Baku. Pretende, assim, não tensionar as relações com os países ricos às vésperas da COP 30.
Missão 1,5
Em uma ficha técnica divulgada na semana passada, o governo brasileiro declarou que “o sucesso da COP 29 será passo fundamental para a COP 30”.
O País, que sediará a conferência em 2025, integra a “troika das presidências da COP”, ao lado dos Emirados Árabes Unidos – que lideraram a cúpula do ano passado – e do Azerbaijão, que exerce o mesmo papel agora. De acordo com o documento do Palácio do Planalto, “esse esforço conjunto busca estimular a cooperação internacional e ampliar o apoio técnico e financeiro necessário para que os países possam aumentar suas ambições climáticas.”
Os três países devem anunciar seus novos compromissos climáticos, as NDCs, ainda na COP 29. Todas as nações signatárias do Acordo de Paris são obrigadas a fazer o mesmo até 10 de fevereiro do ano que vem.
“O Brasil se colocou como bastião da Missão 1,5 e deve liderar pelo exemplo: precisa ser o primeiro país a mostrar como viabilizar esta meta”, avalia Stela Herschmann, especialista em Política Climática do Observatório do Clima. “Todos os compromissos devem ser alinhados a este patamar para que haja de fato uma transição (energética) justa.”
Detentor de quase 60% da Amazônia Legal, o Brasil também pretende avançar em Baku com uma iniciativa ambiciosa que lançou na COP 28 (Dubai). Trata-se do Tropical Forest Finance Facility (TFFF), que pretende remunerar países em desenvolvimento que conservam suas florestas tropicais, destinando o capital investido a ativos verdes e aplicando o retorno para manter a cobertura vegetal em pé.
O TFFF prevê a mobilização de US$ 125 bilhões (aproximadamente R$ 750 bilhões) para financiar a proteção de 1 bilhão de hectares de florestas tropicais em cerca de 70 países em desenvolvimento. Na Conferência da Biodiversidade da ONU (COP 16), realizada em outubro em Cali, na Colômbia, o Brasil angariou o apoio de cinco países à iniciativa: Alemanha, Emirados Árabes Unidos, Malásia, Noruega e o país-sede da cúpula.
Se vingar, o TFFF pode catapultar a restauração ecológica no planeta. Na COP 16, o Brasil lançou a revisão do Plano Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa (Planaveg), que tem como meta recuperar 12 milhões de hectares até 2030. A estratégia é considerada vital para que o país consiga reduzir suas emissões de gases de efeito estufa – tanto assim que o mesmo compromisso consta na NDC apresentada pelo Brasil no Acordo de Paris.
Outro tema da COP 29 alinhado às prioridades nacionais são os sistemas alimentares, um dos avanços mais significativos da conferência realizada pela Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC) em Bonn, na Alemanha, em junho. Na cúpula, os países reconheceram a necessidade de implementar ações climáticas para salvaguardar a segurança alimentar e a resiliência da agricultura frente aos impactos dos eventos climáticos extremos. Um acordo sobre o tema começou a ser costurado na COP 27 (Sharm el-Sheikh), em 2022, e deve ser assinado em Baku.
“A agricultura é o único setor econômico que tem um item na agenda oficial da UNFCCC, dentro de um grupo de trabalho (GT) próprio, onde o Brasil é muito ativo”, destaca Renata Potenza, especialista em Políticas Climáticas do Imaflora.
“Alguns países queriam que o GT tivesse uma governança mais robusta, principalmente o G77 (bloco das nações em desenvolvimento), mas houve oposição dos países desenvolvidos. Devido a esta divergência, passamos meses sem sair do lugar. Felizmente houve um consenso em Bonn e aparentemente há um documento a ser aprovado em Baku, que trará uma série de ações a serem realizadas nos próximos dois anos, como discussões sobre segurança alimentar.”
O Brasil, um dos maiores produtores de alimentos do mundo, tem sido uma liderança vocal nas discussões sobre agricultura, pronunciando-se em nome do G77 e do SUR, grupo de países que compõe com Argentina, Paraguai e Uruguai. A transição dos sistemas alimentares visa disseminar um sistema baseado na produção de baixo carbono – um objetivo com ampla receptividade no Brasil, onde a agropecuária responde por 27% das emissões de gases de efeito estufa, segundo o MapBiomas.