Metas climáticas, cobrança de investidores e estratégias ESG engajam empresas na restauração florestal, mas são necessários critérios científicos e monitoramento para que as ações tenham resultados
Por trás de caixas e outras embalagens no boom do delivery em tempos de Covid-19, do carro que você aluga para escapar de aglomerações, do chocolate, perfume ou café preferidos, e até da conta de energia nas alturas com bandeira vermelha devido aos reservatórios vazios, existe um desafio nem sempre fácil de ser percebido: o da restauração florestal. Da indústria de papel à produção de alimentos e geração de energia, buscar o desmatamento zero e repor árvores tem se mostrado uma estratégia mais fácil e barata na urgência de mitigar a mudança climática, embora o objetivo de não ultrapassar o aquecimento de 1,5 grau em relação aos níveis pré-industriais exija redobrar esforços visando investimentos no efetivo corte de emissões de gases estufa – não somente a captura deles no longo prazo pelo plantio de florestas.
No cenário de caminhos, o potencial da restauração é elevado, até porque, além do clima, estão em jogo a biodiversidade, os recursos hídricos e os demais serviços dos ambientes naturais, vitais à humanidade e à saúde das empresas. Dessa forma, a atividade floresce diante da percepção de riscos à sobrevivência de negócios, principalmente os de alta dependência de recursos naturais. E ganha fôlego no frisson das metas empresariais de redução de carbono para segurança climática do planeta – uma onda que toma corpo no casamento entre ameaças e oportunidades de mercado.
Mais da metade do PIB global depende da natureza, mas, globalmente, estima-se que o capital natural diminuiu 40% em pouco mais de duas décadas, segundo a ONU. Em contraponto, a Década da Restauração de Ecossistemas, lançada em junho, pretende mobilizar o mundo a recuperar pelo menos 350 milhões de hectares de ambientes naturais. E as iniciativas empresariais – pela capilaridade nos territórios, disponibilidade de capital e capacidade de gestão e parcerias – podem fazer a diferença no ganho de escala necessário ao desafio.
“A restauração é intrínseca ao negócio e faz parte do pacote na expansão para novas áreas produtivas”, afirma Marcelo Gomes Pereira, gerente de sustentabilidade e meio ambiente florestal da Suzano, que hoje possui 33 mil hectares em processo de restauração, com tendência de aumento, reflexo do comportamento do mercado nacional e internacional.
É crescente a demanda global de papel para os diversos fins, no esteio do incremento populacional e de políticas de acesso ao consumo em regiões pobres do planeta. No Brasil, um dos principais produtores mundiais de celulose, o contexto se traduz em novas plantações de eucalipto para abastecimento da indústria com fibras, junto a matas nativas conservadas ou restauradas, de acordo com o Código Florestal ou além dele. “A estratégia é olhar para oportunidades na valoração do capital natural, considerando os estoques de carbono como ativos”, enfatiza Pereira.
O permanente desafio, segundo ele, tem sido consolidar o tema no processo de decisão: “Como empresa, temos a vantagem da gestão, com a possibilidade de uso econômico das áreas restauradas. Agora, com base no conhecimento científico, o debate é saber como incorporá-las a novos negócios”.
No território brasileiro visto como uma colcha de retalhos, as áreas sob gestão da Suzano representam um amplo pedaço de 2,7 milhões de hectares, equivalentes ao território do Espírito Santo. Desta forma, o peso da presença das operações florestais traz riscos – e responsabilidades – no compartilhamento da paisagem e seus recursos. No projeto Nascentes do Mucuri, rio que abastece a unidade fabril da companhia no Extremo Sul da Bahia e diversos municípios ao longo do percurso, pequenos produtores são apoiados em práticas sustentáveis.
A iniciativa mapeou 2,5 mil nascentes para entender o nível de degradação e priorizar ações nos próximos anos, considerando o papel das árvores na redução do assoreamento e aumento da infiltração de chuva no solo. Nas diferentes regiões brasileiras, a meta é aumentar a disponibilidade hídrica em 100% das bacias críticas, e hoje a empresa está definindo medidas em 44 prioritárias.
Influenciando políticas públicas
Além disso, a presença nos territórios, com contribuição à economia local e poder de compra junto a fornecedores de eucalipto, tem potencial de influenciar políticas públicas. Atualmente, a empresa apoia a elaboração de Planos Municipais da Mata Atlântica por meio de oficinas de capacitação junto a 35 prefeituras do bioma, na estratégia de avançar na escala da restauração florestal. Segundo Pereira, “o grande desafio é a fragmentação de hábitat das espécies e as ações devem acontecer de forma integrada, e não em frentes isoladas”.
No caso da Suzano, o guarda-chuva das ações está nas metas de biodiversidade, lançadas em junho. A companhia se compromete, até 2030, a conectar meio milhão de hectares de áreas prioritárias para conservação nos biomas Cerrado, Mata Atlântica e Amazônia – o equivalente a quatro vezes a cidade do Rio de Janeiro. Mais de 1,8 mil fragmentos de floresta, hoje isolados, serão interligados – com reflexos na maior resiliência à mudança climática, no fluxo genético e na defesa contra pragas. Em paralelo, está a meta de remover 40 milhões de toneladas de carbono da atmosfera até 2030 e contribuir para que 200 mil pessoas instaladas nas regiões onde atua saiam da linha da pobreza.
“Grandes empresas são como molas propulsoras que levam mais parceiros nessa onda”, observa Samantha de Paiva, consultora de manejo ambiental da Klabin, com plantios de pinus e eucalipto no Paraná, em São Paulo e Santa Catarina, também em expansão.
“O processo de ampliação traz junto a restauração florestal, principalmente na adequação legal das propriedades, no programa de fomento aos fornecedores”, diz Paiva. Hoje, há mais de 2 mil hectares de produtores rurais prevendo selo socioambiental FSC, exigência dos mercados internacionais.
Até 2030, a meta é plantar 1 milhão de mudas. Segundo a consultora, o fortalecimento de parcerias é estratégico para maior chance de êxito em lugares onde há pouco conhecimento sobre restauração, inclusive envolvendo proprietários sem relação comercial com a companhia, no sentido de conectar fragmentos de floresta nativa. Como um laboratório a céu aberto, o projeto Bacia Escola, região do Rio Jaguariaíva – área de expansão produtiva da empresa no Paraná – é modelo de cooperação com os demais usuários da paisagem, incluindo a sede do município, abastecida pelo manancial. “No conceito de ‘manejo hidrosolidário’, em caso de riscos de impacto, entra a restauração ou mudanças nas operações florestais”, destaca Paiva.
“Como vizinhos, queremos contribuir com o desenvolvimento das comunidades diante dos diferentes usos do solo”, reforça Marcos Alexandre Danieli, consultor de responsabilidade social e relações com a comunidade da Klabin, à frente do programa Matas Sociais. Com ações em 14 municípios do Paraná e Santa Catarina, o objetivo é ampliar as cadeias da agricultura familiar via assistência técnica e acesso a mercados, abrangendo recuperação de nascentes e matas na beira dos rios, além do conceito de economia circular. Em Ortigueira (PR), uma parte dos resíduos industriais da companhia é destinada como adubo aos plantios próprios de pinus e eucalipto e outra parte vai para os produtores locais, dos quais a empresa compra alimentos para os refeitórios.
Em 2020, 66% dos agricultores reduziram o uso de agrotóxicos e 72% tiveram aumento de renda. Mais de 34 mil mudas foram doadas. “A agenda da restauração tem potencial de unificar diferentes setores e ideologias, de grandes proprietários a agricultores familiares ligados a movimentos sociais, o que é fundamental para dar escala”, analisa Miriam Prochnow, conselheira da Apremavi, ONG parceira da Klabin nas ações socioambientais. Com viveiro para 1 milhão de mudas da Mata Atlântica por ano, o plano atual é replicar a experiência de sucesso junto a empresas do setor de agropecuária, por meio de um consórcio de organizações, no âmbito do Observatório do Código Florestal, com apoio do governo da Noruega.
Mosaicos florestais
“Os plantios em mosaicos florestais permitem unir produção e conservação: as matas nativas dispersam propágulos para a regeneração natural de áreas do entorno e contribuem no negócio controle de pragas do eucalipto, beneficiando o negócio”, explica Virginia de Camargos, coordenadora de estratégia ambiental da Veracel, em Porto Seguro, Sul da Bahia.
Na região, a reposição de árvores da Mata Atlântica em corredores ecológicos tem ainda o potencial de fortalecer a observação de aves, atividade que se desenvolve como modelo que valoriza a biodiversidade e gera renda. Na Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN) Estação Veracel, mais de 1 mil pessoas por ano, de várias partes do mundo, buscam contato para a prática do hobby, com possibilidade de render US$ 200 por visitante/dia em serviços locais. Aldeias pataxós do entorno começam a incorporar a novidade às atrações ofertadas a turistas.
“Temos cerca de 7,1 mil hectares restaurados, com 3 milhões de árvores nativas, e a meta é chegar a mais 700 hectares em 2024, decorrentes da adequação da cadeia de fornecedores ao Cadastro Ambiental Rural (CAR)”, informa Camargos. Na plataforma global Forests Forward, mantida pelo WWF, a companhia assume compromissos de investir em práticas florestais sustentáveis, no caminho da agroecologia.
“Restaurar faz parte do business mas, para uma maior expansão, faltam políticas públicas em benefício dos pequenos produtores rurais que conservam floresta”, afirma Camargos.
A reposição de árvores se integra ao aspecto econômico e social, no suporte a assentamentos agroecológicos que abrangem cerca de 1,3 mil famílias na região. “Diferentes integrantes da cadeia florestal entendem cada vez mais que não podem atuar de maneira isolada e, para isso, precisam dialogar, com uma visão integrada de paisagem”, enfatiza Fernanda Rodrigues, secretária executiva do Diálogo Florestal. Inspirada na experiência internacional do The Forests Dialogue, a aliança tem cerca de 100 membros da academia, organizações da sociedade civil e empresas, com atuação em fóruns regionais. “A diversidade se torna uma palavra-chave nesse contexto”, diz Rodrigues.
Contra riscos na geração de energia
No setor energético, a restauração florestal está no cerne da segurança hídrica, cujos riscos provocam cenários de impacto à economia de uma maneira geral como visto hoje, diante da necessidade de ligar usinas térmicas a gás e óleo para garantir o abastecimento – com maior custo ao consumidor e mais emissões de carbono. No mix de problemáticas, a falta de chuvas se soma a conflitos de uso da paisagem e ao desmatamento das margens dos reservatórios e entorno, com influência no ciclo hidrológico, no microclima e no aumento de sedimentos, o que, consequentemente, traz prejuízos à geração de energia. As projeções de efeitos da mudança climática no setor elevam o nível das preocupações e um dos caminhos tem sido plantar árvores para aumentar a vida útil das usinas.
“Cada vez mais a questão influencia a decisão e escolha de áreas para novos empreendimentos”, aponta Odemberg Veronez, coordenador de condicionantes de licenciamentos da AES Brasil, com meta de atingir 243 hectares de Mata Atlântica restaurada em 2021.
O diferencial, segundo ele, é ir além das obrigações legais, olhando para uma estratégia de propósito e mitigação de riscos, em cooperação com parceiros, para melhor investimento dos recursos. “Sozinhos, dificilmente podemos avançar”, pondera, ao informar que a meta é reflorestar 200 hectares no entorno das usinas no interior de São Paulo, neste ano.
Grande parte das ações se dá por meio da sinergia com empreendimentos que precisam de áreas para plantar árvores como compensação ambiental de seus impactos, a exemplo do Aeroporto de Viracopos, por meio do programa Mãos na Mata, que cede insumos e monitora o plantio. Na Usina de Promissão (SP), a AES mantém viveiro com capacidade anual de 1 milhão de mudas, de 120 espécies, e a restauração tem se traduzido no retorno da fauna a áreas de entorno, inclusive onças-pardas e lobos-guarás, conforme monitoramento do Pró-Carnívoros e Save Brasil.
“A lógica dos negócios aplicada às questões ambientais traz mais investimento, governança e parceiras com academia e ONGs, com oportunidades para geração de novos conhecimentos”, enfatiza Veronez. Foi o caso do estudo sobre novo método que emprega adubação verde e reduz herbicidas químicos para controle de gramíneas invasoras na restauração ecológica. Por meio da técnica, em parceria com a WeForest, foram recuperados 56 hectares na margem do reservatório de Ibitinga, no ano passado.
Na Usina Hidrelétrica de Itaipu, em Foz Iguaçu (PR), o processo de restauração começou há mais de quatro décadas, com a demarcação de áreas ao redor do reservatório para receber árvores. A partir daí foram plantados 40 mil hectares de floresta na margem brasileira do lago, junto a três reservas ecológicas e remanescentes de mata nativa, com grande salto na escala partir de 2003. Na época, a atividade se incorporou a um programa de gestão por microbacias hidrográficas, ampliando-se por meio de parceria com custos rateados entre prefeituras e empresa.
Em dez anos, foram implantadas mais de 5 milhões de mudas somente para compor mata ciliar na beira de cursos d’água, em conjunto com as propriedades. No total, a previsão para 2021 é atingir 24 milhões de mudas na borda do reservatório.
“Queremos entender melhor os benefícios para a biodiversidade, monitorando a fauna e a regeneração de espécies vegetais que não foram plantadas”, revela Veridiana Pereira, engenheira florestal da divisão de áreas protegidas de Itaipu, que mantém banco de germoplasma e viveiro para 350 mil mudas ao ano.
No Corredor de Biodiversidade do Rio Paraná, a empresa apoia a ONG Mater Natura em um projeto junto ao BNDES para restaurar áreas de assentamentos rurais, no entorno de parques nacionais e estaduais. “O nexo água-floresta-energia é uma história consolidada na gestão da companhia”, garante Pereira. Ela reforça: “A restauração precisa de continuidade, com grande esforço de manutenção e apoio da ciência”.
Na indústria de bebidas, a restaurar é garantir a principal fonte do negócio. Na cerveja, por exemplo, a água compõe 90% do produto. “Devemos olhar além dos muros para as condições da bacia hidrográfica e os riscos de escassez”, ressalta Ornella Vilardo, gerente sênior de sustentabilidade do Grupo Heineken. Em Itu (SP), onde se localiza a sua maior fábrica no Brasil, a companhia só escapou do pior na crise hídrica de 2014 devido à regeneração de 526 hectares de mata na área do manancial que abastece a unidade, a 8 Km de distância.
No local, cedido como comodato à SOS Mata Atlântica, funciona o Centro de Experimentos Florestais, com viveiro de mudas, atividades de educação ambiental e trabalhos em parceria com empresas. “Estamos definindo novas metas para o Brasil em função dos compromissos globais com a neutralidade de carbono, somados à necessidade de água para cervejarias localizadas em bacias em estresse hídrico, como em Itu (SP) e Pacatuba (CE)”, revela Vilardo.
Impulso com a demanda climática
Além da dependência hídrica, a compensação de carbono por empresas que precisam cortar emissões de gases-estufa é a bola da vez para investimentos em restauração. A mineradora Vale começou a investir no plano de reflorestar 100 mil hectares em áreas degradadas até 2030, por meio de negócios de impacto socioambiental positivo, com ênfase em agroflorestas. Neste ano, o objetivo é o aporte de R$ 100 milhões à recuperação de 6 mil hectares para captura de carbono, no contexto da meta global da empresa: tornar-se neutra em emissões até 2050. Nesta década, a previsão é investir pelo menos US$ 2 bilhões no compromisso, visando reduzir em um terço os gases de efeito estufa no período.
Inicialmente, o Fundo Vale repassou recursos para seis projetos-piloto de startups voltadas a diferentes modelos de sistemas agroflorestais e silvipastoris, que conciliam criação de gado com o cultivo de espécies nativas. No agronegócio, a JBS, maior produtor mundial de proteína animal, pretende neutralizar emissões e aposta na Integração Lavoura, Pecuária e Floresta (ILPF), em parceria com a Embrapa, para atingir o compromisso da carne carbono neutro. O sistema é adotado em mais de 17 milhões de hectares no País, com previsão de dobrar nesta década.
Em paralelo, o Fundo JBS Amazônia, criado em 2020, pretende investir R$ 1 bilhão, até 2030, para fomentar a restauração e conservação da floresta, com desenvolvimento socioeconômico. “É preciso reduzir desmatamento e trazer serviços ambientais para dentro das pastagens”, ressalta Andrew Miccolis, coordenador do Centro Internacional de Pesquisa em Agrossilvicultura. Ele avalia que o Brasil apresenta grande potencial no desafio, mas a atual conjuntura traz incertezas.
Laura Antoniazzi, pesquisadora sênior da Agroicone, voltada a estudos e assistência técnica no setor, concorda: “É crescente o protagonismo das empresas na restauração, mas há movimentos em direções opostas”.
Segundo ela, a atual corrida da iniciativa privada nessa agenda, com efeito cascata em suas cadeias produtivas, contrasta como o vácuo dos governos, principalmente no Brasil – e há risco de planos não acontecerem na ponta devido a gargalos de políticas públicas. “Temos condições de sair dos pilotos e aumentar a escala, mas é preciso planejamento”, diz Antoniazzi.
Além da gestão, o desafio exige soluções para viabilizar a recuperação de floresta diante das diferentes realidades das regiões e atividades produtivas. “Na Mata Atlântica, as ações beberam muito na tradição da silvicultura de eucalipto, com cultivo de mudas”, afirma a pesquisadora. Para ela, a semeadura direta – ou seja, o plantio por meio de sementes – pode mostrar-se mais atrativo e eficiente no contexto das grandes fazendas do agronegócio, com demanda por áreas maiores, no Cerrado. “O método pode fazer a diferença, pois permite o uso do maquinário e as técnicas de manejo do solo da agropecuária”, explica.
Segundo ela, a depender da área e outros fatores, o custo do uso de sementes pode representar um terço do verificado no plantio de mudas. “Isso ajudará a restauração florestal a pular de mil para milhões de hectares”, aponta Antoniazzi. Em parceria com a Agroicone, a Usina Santa Isabel, no noroeste de São Paulo, serviu de vitrine para o setor sucroalcooleiro na semeadura direta, mas as iniciativas permanecem pontuais. “Empresas do agronegócio aguardam maiores desdobramentos do cenário legal envolvendo o Cadastro Ambiental Rural, na esfera dos governos estaduais”, analisa a pesquisadora.
Apesar da pequena escala, o café e o cacau buscam valorização no mercado pela origem em Sistema Agroflorestal (SAF), envolvendo a restauração de áreas degradadas. Na ponta da cadeia, a multinacional de chocolates Mondelez trabalha em cooperação com ONGs, como a The Nature Conservancy (TNC), para alcançar o chão em localidades produtoras e cerca de 700 hectares de pastagens já foram transformados em agroflorestas com cacau, no Pará e Bahia. O objetivo da fabricante é chegar a 1 mil hectares até 2025, no total de R$ 10 milhões investidos, visando ter globalmente toda a produção oriunda de fonte sustentável até 2024. Hoje, o índice está em 68%.
Grandes corporações mobilizam cadeias de fornecedores como estratégia essencial ao carbono neutro. “A ciência tem mostrado que 40% do que se pode fazer no combate à mudança climática está na natureza”, destaca Rubens Benini, líder de restauração florestal na TNC, ao advertir que as ações precisam acontecer nesta década, pois “estamos no limiar do tipping point”, o ponto crítico de não retorno ao cenário de segurança climática.
Em sua análise, as empresas precisam compensar emissões enquanto não conseguem reduzi-las diretamente com tecnologias e mudança da matriz energética, que demandam tempo e maior custo. A onda ESG (Environmental, Social and Governance), impulsionada pelo mercado financeiro, tem multiplicado globalmente metas e compromissos empresariais que precisam de monitoramento para que saiam do papel, além de cuidados contra o greenwashing.Na restauração florestal, diz Benini, “é necessário investir em projetos sérios que mostrem resultados de forma transparente”.
Na plataforma Restaura Brasil, a TNC mobiliza doações para iniciativas em diferentes regiões do País, como o Conservador da Mantiqueira, programa que reúne diversas organizações para apoio a políticas públicas locais e suporte a produtores rurais na restauração florestal, com acesso a investidores. Entre eles, figura o Mercado Livre, líder em tecnologia para e-commerce que registrou expressivo crescimento com as demandas do distanciamento social na pandemia e busca mitigar emissões de carbono.
A empresa está investindo R$ 47 milhões na região por meio de um arranjo inovador. Além de medidas para promover a regeneração natural da Mata Atlântica, está previsto Pagamento por Serviços Ambientais (PSA) para produtores rurais por cinco anos e a negociação de créditos de carbono no mercado. O objetivo é abranger 2,7 mil hectares, em mais de 700 propriedades, no primeiro ano.
A demanda climática mobiliza investimentos também no Cerrado. “O reflorestamento é o principal meio de neutralizar o carbono emitido pelos clientes no aluguel de carros, com o diferencial de proporcionar impacto positivo para as comunidades”, observa Livia Friseira, responsável pela área de sustentabilidade da Movida. Na ambição de tornar-se carbono positivo até 2040, a estratégia no momento é o aporte de R$ 9 milhões no plantio de 1 milhão de árvores, em dois anos, no projeto Corredor do Araguaia, liderado pela Fundação Black Jaguar com objetivo de recuperar 1 milhão de hectares de áreas degradadas em 112 municípios do Cerrado e Amazônia.
Em 2020, foram plantadas 32 mil mudas, visando a captura de 4,6 mil toneladas de carbono, suficientes para compensar todas as emissões internas da empresa, sem contar as relativas ao uso dos veículos pelos clientes. “O preço interno do carbono pesa na tomada de decisão sobre reduzir o impacto com investimento em frota menos emissora ou compensar as emissões com árvores”, explica Friseira, prevendo avançar em mais áreas de reflorestamento como solução, além da eletrificação dos veículos ao longo desta década. “O desafio é tangibilizar isso para o cliente”, completa. Para o atual movimento empresarial na restauração de ecossistemas fazer sentido, é necessário o envolvimento do consumidor final.
[Fotos: Apremavi]