A Rio+20 é uma oportunidade para debatermos como a educação pode exercer um papel central na construção de um novo paradigma civilizatório
No momento em que o mundo se organiza para a conferência mundial da ONU, a Rio+20, vale enfatizarmos, mais uma vez, o grande paradoxo da nossa civilização: ao mesmo tempo que o desenvolvimento das tecnologias possibilitou uma nunca antes possível convivência global entre os povos, vemos a nossa própria sobrevivência ameaçada enquanto espécie devido às mudanças climáticas e suas consequências.
No contexto da discussão de uma nova economia, como analisa o professor Ricardo Abramovay, a relação entre sociedade e natureza deve estar pautada, de um lado, pelos limites impostos por essa relação e, de outro, pela inovação que torne possível melhorar o modo como se obtém e se transforma a energia, os materiais e a própria biodiversidade em produtos e serviços úteis para a sociedade. A ética, então, torna-se um aspecto central na determinação do uso dos recursos e nas decisões econômicas, que devem ter como eixo o bem-estar das pessoas, a equidade social, a coesão das comunidades e a preservação e regeneração dos ecossistemas.
A educação passa a ser, assim, um instrumento primordial para tornar possível a construção desse novo paradigma, pois é necessário formar, capacitar as pessoas de todas as idades para assumirem responsabilidade pelo futuro sustentável. Os direitos humanos e o compromisso com a justiça social para todos implicam, no novo paradigma, uma responsabilidade intergeracional.
Exercício de longo prazo
No Brasil, onde temos pouca experiência de planejamento em prazos mais longos, a educação para o desenvolvimento sustentável deve ser um processo de aprendizagem de como tomar decisões que consideram no longo prazo todos os condicionantes mencionados anteriormente. A diversidade cultural, o respeito às diferenças, o diálogo, a cooperação e o cuidado são valores fundamentais que embasam essa educação, assim como uma inovação que busque respostas aos novos desafios por meio da resolução de problemas, de um pensamento científico que deve ocupar também um lugar central na educação ao longo da vida.
Precisamos criar verdadeiras comunidades de aprendizagem, em que a educação se apoie na cultura como um amálgama na vinculação entre o indivíduo e o coletivo, entre as pessoas, entre passado, presente, futuro, entre os saberes tradicionais e a modernidade, entre as diferentes identidades. Somos seres geneticamente sociais, e essa é a nossa maior riqueza para construir vínculos através da linguagem, das relações afetivas, do conhecimento, das obras de arte, do patrimônio cultural, das tradições e dos costumes. A escola sozinha não pode dar conta de todos esses aspectos, por isso ela deve estar aberta e inserida nas comunidades onde atua, usando seus diferentes espaços sociais, esportivos e culturais para propiciar uma formação democrática, contemporânea e responsável por um futuro sustentável do planeta.
A pobreza de conhecimento e de referências culturais é um obstáculo ao desenvolvimento individual e coletivo que impede o reconhecimento social, fundamental à nossa existência e convivência social. Dar visibilidade e voz aos diferentes protagonistas da sociedade torna-se uma tarefa cada vez mais imprescindível para o alcance da sustentabilidade do planeta, e as tecnologias digitais jogam um papel importante nesse contexto, por meio do alargamento do espaço público, da criatividade, da multiplicidade de vozes, da cooperação, da fluidez, da mobilização e da velocidade.
Como escrevi no início deste artigo, vivemos um grande paradoxo e a Rio+20 é uma oportunidade para debatermos como a educação pode ser fundamental na construção de um novo paradigma civilizatório; resta conferir se as condições estarão dadas.
Doutora em Psicologia da Educação (PUC-SP) e presidente dos conselhos do Instituto Democracia e Sustentabilidade (IDS), do Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (Cenpec) e da Fundação Tide Setubal