Por Amália Safatle
O Brasil não precisa acabar com as saúvas. E nem deve. Prova disso está nas fazendas da família Balbo, em Sertãozinho, interior de São Paulo, onde bactérias, fungos, formigas e uma miríade de outros insetos convivem com a monocultura de cana-de-açúcar de alta produtividade. Os bichos não só não atacam uma folha sequer da cana como formam uma rede poderosa, capaz de alimentar o solo a tal ponto que as plantas, de tão bem nutridas, dispensam adubos e agrotóxicos. Essa cadeia alimentar alça altos níveis, compondo uma biodiversidade que espantosamente supera a registrada em áreas protegidas.
Essa revolução silenciosa tem ganhado voz. Chegou a hora de Leontino Balbo Jr.*, o maior exportador de açúcar orgânico do mundo, vender mais do que produtos a 64 países. Tem muita gente interessada no know-how e na tecnologia que ele chama de Agricultura Revitalizadora de Ecossistemas. Trata-se de um novo paradigma que se propõe a substituir a Revolução Verde dos anos 1960, cujo pacote tecnológico não se sustenta no futuro e coloca sob ameaça a segurança alimentar.
Em vez de adicionar produtos de fora para dentro no sistema agrícola, exigindo cada vez mais recursos para menores resultados, o engenheiro agrônomo avisa que é preciso inverter a lógica. Deixar que o solo provenha os insumos, de dentro para fora. A natureza já sabe fazer isso, mas é preciso dar as condições para que ela possa trabalhar. Como ele descobriu isso? Com quase 20 anos de pesquisa, e muitas incursões no que chama de seu habitat, a floresta, onde ele para, respira, observa. E copia.
* Formado em Agronomia pela Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, é diretor agrícola das usinas São Francisco e Santo Antônio e vice-presidente-executivo da Native Produtos Orgânicos
O que é a Agricultura Revitalizadora que o senhor propõe?
A Agricultura Revitalizadora de Ecossistemas é uma nova técnica de produção agrícola inspirada nos métodos naturais de produção vegetal e animal. A sigla ERA – Ecosystem Revitalizing Agriculture – foi originalmente concebida em inglês, pois está destinada a se tornar uma alternativa universal aos sistemas intensivos de agricultura convencional. A premissa científica fundamental envolvida na sua idealização remete aos primórdios da criação e desenvolvimento da vida na Terra. Quer seja, promover-se de forma natural a mais intensa interação possível entre energia, minerais e organismos vivos. A sua implantação em um dado ecossistema agrícola resulta na produção agrícola abundante e de alta qualidade, na restauração dos recursos naturais presentes, além da geração de potentes serviços ecossistêmicos de grande alcance e abrangência ecológica.
Um exemplo dos serviços ecossistêmicos gerados é que o sistema ERA de produção restaura a biodiversidade na propriedade rural, em seus diversos níveis tróficos de vida [etapas da cadeia alimentar], ao mesmo tempo que a integra e engaja no novo manejo biológico de produção. Inventários realizados ao longo de 15 anos por pesquisadores da Embrapa [Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária] registraram mais de 340 espécies de vertebrados superiores, o que equivale ao encontrado nos maciços florestais mais bem preservados do Estado de São Paulo.
O senhor entende a Agricultura Revitalizadora como o novo paradigma que precisa substituir o da Revolução Verde?
A Revolução Verde foi lançada como um modelo que usa, de forma combinada na agricultura, insumos industriais químicos, o melhoramento genético de plantas (na época, eram as sementes híbridas), alto grau de mecanização e o uso de produtos homogêneos. Este pacote tecnológico foi bem-sucedido no que diz respeito ao aumento da produtividade, mas ao longo do tempo causou degradação ambiental em vários níveis, notadamente nos solos. O mais visível e mensurável foi a intensa degradação da bioestrutura dos solos agrícolas, de forma que os solos em que a tecnologia é aplicada há mais tempo não conseguem mais responder a ela. Existem áreas nos países pioneiros nessa tecnologia nas quais a produtividade está diminuindo, mesmo quando se incorpora tudo o que a tecnologia moderna tem a oferecer. Se uma tecnologia produtiva degrada o solo, as futuras gerações estão em risco. Então o bom senso nos diz que ela tem de ser substituída.
Segundo suas declarações, não haverá alternativa para a agricultura no mundo que não leve a essa nova visão, com adoção crescente de métodos naturais. Os players da agricultura convencional – produtores, empresas, financiadores, investidores – ainda resistem a essa ideia, ou podemos dizer que já teve início uma tendência de conscientização? Desde quando?
Há mais de 25 anos venho preparando a fundamentação científica da Agricultura Revitalizadora, pois acredito que preciso fazer algo altruístico com o que aprendi, e não só usar em proveito privado. Assim, em novembro do ano passado, promovi um seminário com mais de 20 horas de duração, ao longo do qual divulguei o novo sistema de produção, mostrando detalhes tanto do sistema em si como de seus amplos resultados circundantes. Estavam presentes representantes das mais renomadas instituições brasileiras de pesquisa e ensino agronômico, assim como os mais renomados consultores em cana-de-açúcar do País. Eu esperava que minhas propostas seriam ferrenhamente combatidas, mas, para minha enorme surpresa, ao final dos dois dias de seminário, não houve uma oposição sequer. Assim, percebi que esse desafio está superado, que é tudo uma questão de compreensão, de olhar a verdade de dentro para fora e não somente de fora para dentro. Já recebi diversas propostas de parceria por parte de tecnólogos da agricultura convencional para expandir a divulgação da tecnologia.
Em que ponto a agricultura convencional está no caminho de se aproximar de práticas mais naturais?
Infelizmente, não se aproxima em ponto algum. Pela definição que criei, uma prática agrícola só pode ser considerada natural, biológica ou agroecológica quando as práticas agronômicas aplicadas promovem a restauração da teia alimentar no ecossistema agrícola a um nível tal em que os organismos vivos que compõem a teia passem a se engajar no manejo da cultura. A agricultura convencional caracteriza-se notadamente pelo uso de biocidas químicos ou pela intensificação de práticas abióticas, ou seja, contrárias à manutenção e à proliferação da vida. Sem a presença de organismos vivos que interajam permanentemente de forma específica com as plantas da cultura comercial, estas não terão sua fisiologia e sistemas enzimáticos atuando em modo natural. Ou seja, continuarão vulneráveis ao ataque de pragas e doenças, o que não acontece com plantas comerciais sob manejo da Agricultura Revitalizadora. As práticas da agricultura convencional levam à diminuição gradual da quantidade de conexões biológicas nos ambientes agrícolas e isso torna o ambiente cada vez menos resiliente. Por outro lado, o sistema ERA de produção eleva exponencialmente o número de conexões biológicas em uma propriedade rural, o que aumenta a resiliência natural deste ambiente como um todo. (Para saber mais, aqui)
A formação acadêmica agronômica ainda parece desvinculada dos desafios socioambientais. Falta informação, técnica, motivação? O problema é cultural?
Acredito que haja três motivos principais. As bases da agricultura convencional foram lançadas há aproximadamente140 anos e, portanto, ela representa a tradição. Uma das forças que compõem a tradição é conservação dos costumes já aceitos e validados ao longo do tempo. Não estou dizendo que isso é ruim, e sim uma barreira cultural difícil de ser mudada ou transposta. Mas com perseverança e sabedoria é possível tornar a agricultura biológica um novo costume, pois a única constante no universo é a mudança.
O segundo motivo é que falta estímulo oficial para que as instituições de pesquisa direcionem esforços no campo da pesquisa em agroecologia, orgânicos etc.
Sabemos que existe a vontade por parte dos pesquisadores, mas, como teriam de começar praticamente da estaca zero, os investimentos e as verbas seriam muito grandes. Instituições de pesquisa e universidades de agronomia do País criaram núcleos para desenvolver pesquisa nesta área, mas têm dificuldades para obter verbas. A Embrapa, por exemplo, já desenvolve pesquisa sobre cultivos orgânicos.
O terceiro motivo é que é exercida sobre o produtor e sobre as universidades uma pressão constante e muito forte do marketing das multinacionais para vender ao mercado seus pacotes tecnológicos, sobre os quais detêm direitos de propriedade intelectual. Este último detalhe possibilita que as corporações usem a agricultura convencional intensiva como meio para cumprir suas agendas corporativas.
Como as multinacionais desenvolvem tecnologias a uma velocidade muito maior do que as universidades, estas últimas geralmente perdem a corrida no campo do desenvolvimento tecnológico – o que tem possibilitado que as corporações que dominam o mercado de sementes e dos agroquímicos detenham a hegemonia tecnológica no setor e ditem as práticas agrícolas a serem adotadas pela agricultura brasileira. Isso criou uma dependência exacerbada do setor produtivo das corporações que dominam o mercado de sementes, fertilizantes, agrotóxicos e também de máquinas agrícolas. No sistema ERA, o produtor recupera o poder de decidir o que é bom para sua propriedade ou cultura.
É isso que impede a maior replicação de casos como os da Native no Brasil?
Falta conhecimento por parte dos produtores e instituições de pesquisa e ensino acerca do abrangente potencial da Agricultura Revitalizadora, assim como falta conhecimento das suas práticas específicas.
Se uma maior produtividade foi comprovada na Usina São Francisco, que produz o açúcar orgânico da Native, por que o plantio convencional ainda existe em outras usinas da família Balbo?
Não existe mais cultivo convencional nas outras unidades do Grupo Balbo. Na São Francisco, temos 100% da área sob manejo da Agricultura Revitalizadora, ou 14 mil hectares. Na unidade vizinha, temos 8 mil hectares de canaviais orgânicos certificados e outros 7 mil hectares sob um manejo que chamamos de integrado, que é um híbrido entre convencional e orgânico, mas de forma que não se acrescente ao produto convencional os custos inerentes ao cumprimento de algumas normas de certificação de caráter restritivo.
A implantação do manejo integrado resultou em significativo ganho de produtividade, muito superior à média dos manejos convencionais tradicionais. E com redução de pelo menos 50% dos impactos ambientais em comparação à agricultura canavieira convencional intensiva. Trata-se de um manejo de transição entre o convencional e o ERA, e a velocidade da transição será ditada pela evolução da demanda de produtos orgânicos pelo mercado. Na unidade de Minas Gerais, 100% dos 23 mil hectares são de manejo integrado, e as produtividades obtidas têm nos surpreendido a cada ano.
Que balanço o senhor faz desses quase 20 anos de atividade? As dificuldades hoje são bem menores? Maiores, diferentes?
As dificuldades iniciais foram enormes, mas superadas com a estratégia de se avançar por partes. Primeiro, desenvolvendo-se um sistema de colheita de cana colhida crua, sem queima. Em seguida, substituindo os fertilizantes químicos. Depois, eliminando-se os agrotóxicos, e por aí foi… As dificuldades hoje são menores no campo operacional, mais maiores no campo mental, pois temos pouca influência sobre a maioria delas. São relativas à inexistência de políticas públicas que incentivem o consumo de orgânicos, infraestrutura logística inadequada (interna e exportação) e cara, taxação muito maior em valores absolutos comparada a um produto convencional equivalente, margens do varejo maiores para orgânicos do que para convencionais etc.
Para se ter uma ideia, um suco que vendemos a R$ 10 foi encontrado por R$ 31 numa dada rede de supermercado. Governo e lojistas ficam com mais de 80% da margem líquida obtida com a venda de nossos produtos. É perfeitamente possível implantar-se uma normatização geral para produtos dessa natureza para que mais consumidores sejam beneficiados, sem prejuízo para os demais atores da cadeia. Outra questão a ser discutida é a incorporação das externalidadas negativas nos preços dos produtos convencionais. Pois os dumpings social, ambiental e econômico carregados às prateleiras por alguns produtos convencionais presentes no mercado chegam a ser obscenos.
E quais são os próximos passos? As pessoas e o planeta ganhariam se experiências como essa pudessem deixar de ser pontuais e ganhassem replicação e maior escala. Chegou o momento de vender não só o produto e as visões de mundo, mas a tecnologia e o know-how de todo esse processo, para ser colocado em prática pelos outros?
Não se consegue reter uma nova tecnologia por muito tempo. Principalmente se for verdadeiramente benéfica. Assim, os fundamentos da Agricultura Revitalizadora já estão sendo divulgados. Tenho tido apoio de importantes instituições ao redor do mundo. Uma em particular, a Ellen MacArthur Foundation, tem investido recursos próprios nessa divulgação, inclusive com a produção de um filme sobre o sistema (vimeo.com/145956542, senha: dif). Em 22 de junho serei entrevistado pela própria Ellen MacArthur no lendário Abbey Road Studios, em Londres, com veiculação na mídia europeia.
Como divulgar a tecnologia sem ameaçar o próprio negócio, criando concorrentes de cana verde para um mercado ainda limitado? O senhor pensa em incorporar esse know-how a outras culturas, e assim evitar o problema da concorrência?
No ramo dos produtos oriundos do processamento da cana, a disseminação do sistema ERA vinculado a alianças estrátegicas com o nosso grupo potencializaria nossa capacidade de realização. Nosso negócio se expandiu além das fronteiras da cana-de-açúcar. A Native desenvolveu ampla linha de alimentos orgânicos, como sucos de frutas, cereais, chocolates, achocolatado, azeite, biscoitos, cafés, bebidas à base de soja etc. A conversão ao sistema ERA de produção de culturas cujos ingredientes a Native vai precisar no futuro seria altamente desejável. A disseminação do sistema para outras culturas só agregaria valor ao nosso negócio.
O senhor acha que é possível alimentar o mundo só com orgânicos?
Não tenho dúvidas que sim. Os combatentes das diferentes formas de agricultura biológica dizem que não é possível porque a produtividade é menor. Mas nossa produtividade tem sido, por mais de 15 anos, 20% maior que a média da região na qual se localizam nossas fazendas. Em vez de perder tempo repetindo isso, deveriam ser mais humildes e virem aqui buscar entender do que se trata estes sistemas biológicos de produção. É preciso que entendam que a agricultura orgânica tradicional evoluiu muito nos últimos 15 a 20 anos e já se encontra em outro patamar de produtividade. Estudos recentes realizados pela Universidade de Washington demonstram que a produtividade da agricultura orgânica chega a ser até maior em alguns dos casos avaliados. Estudos similares realizados pelo Instituto Rodale, na Pensilvânia, Estados Unidos, chegaram à mesma conclusão. Meu amigo Norman Uphoff, da Universidade Cornell, desenvolveu um sistema orgânico de produção de arroz que dobrou a produtividade em plantações da Índia, Camboja e Vietnã. Ele divulgou seu método de produção naqueles países porque foi muito combatido nos Estados Unidos! Porém, o mais importante é que na produção orgânica a energia total usada demandada é cerca de 30 % menor! Nem estou falando do sistema ERA, que é um “salto” sobre a agricultura orgânica tradicional. Se a discussão for por esse caminho, tenho os arquivos de 25 anos de dados acumulados, validados por instituições idôneas de pesquisa, que me permitem afirmar que o uso de todo o arsenal oferecido pela tecnologia convencional de produção de cana resulta em campos significativamente menos produtivos que nos campos onde o ERA foi implantado.
Sobre a declaração de que “Não vendo produto, vendo uma proposta de vida; o produto vai de brinde”, como contorna as dificuldades para comercializar seus produtos já que os canais convencionais de comércio não reconhecem seus atributos positivos?
Nós estudamos o ciclo de vida de cada um de nossos produtos para entender como os impactos positivos ou negativos gerados pela cadeia de produção de cada um deles afeta a vida das pessoas. Depois organizamos essas informações na forma de material promocional educacional e as levamos para os consumidores. Então eles terão uma ideia sobre como podem incorporar o que consideramos elevados atributos de sustentabilidade e saudabilidade em suas vidas e das suas famílias. Assim, a decisão de compra do produto não fica só na comparação de preços, mas no entendimento acerca do valor que o mesmo tem para o consumidor. Os varejistas apreciam muito esse trabalho, porque entendem que estamos educando os consumidores para o consumo de produtos de valor. O mesmo trabalho é feito com empresas que usam nosso açúcar e álcool como matéria-prima para fabricação de seus produtos, quer sejam alimentos, quer sejam perfumes etc.
Em todos esses anos de projeto orgânico, como vem se comportando a curva de custo de produção? Há esperança de os preços dos orgânicos na gôndola ficarem mais acessíveis?
O manejo convencional já é mais que centenário e sua contribuição atingiu seu apogeu. E considero que enfrenta o início de sua queda, enquanto o sistema ERA tem pouco mais de 20 anos de aplicação efetiva. Aprendemos com os desafios que se apresentam todos os dias e dessa forma temos tido muitas oportunidades de aperfeiçoar o sistema. Os custos são relativamente decrescentes e isso nos anima muito. Há muito ainda a ser feito, especialmente na área de mecanização agrícola. Estamos desenhando uma mudança significativa no conjunto de operações mecanizadas que deverá trazer significativa redução de custos num futuro próximo.
Quais as barreiras enfrentadas para emplacar esses conceitos no mercado? Qual o segredo para sobreviver nesse ambiente de gigantes? Seria a diferenciação e a agregação de valor?
A grande diferenciação da Native é oferecer o que os grandes não podem oferecer no momento. Temos 23 certificações, entre as orgânicas, as socioambientais, as de comércio justo e as de qualidade de produto. O consumidor já aprendeu a dar valor às certificações. Mas não é só isso. Investimos em um departamento de desenvolvimento de novos produtos no qual temos 14 engenheiros de alimentos trabalhando em novas formulações de alimentos orgânicos. Todos os produtos desenvolvidos têm de atender a 10 pilares da marca Native.
A funcionalidade é um deles. Exemplo, nossos cereais têm quatro vezes menos sódio que os convencionais do mercado. Outro pilar é que um produto só é lançado no mercado quando conseguimos que o novo alimento seja mais gostoso que todos os outros produtos similares convencionais ou orgânicos – pelo menos de acordo com a nossa avaliação. E por aí vai… Isso tudo se configura em um ativo que dificilmente grandes empresas focadas no resultado de curto prazo teriam condições de desenvolver.
Qualquer movimento dos grandes na direção dos orgânicos chamaria a atenção do consumidor para o que pode ter por trás da produção dos seus convencionais. Por este motivo, nos Estados Unidos, as grandes empresas de alimentos convencionais já compraram mais de 70% das pioneiras de orgânicos, mas mantiveram as marcas originais.
Como toda essa história começou? De onde nasceu essa vontade pessoal?
Com 3 ou 4 anos de idade eu já escapava de casa com uma varinha de pescar, shorts e bicicleta. Enfiava a mão em tudo quanto é buraco, poça d’água, lagoa e córrego pra pegar bagre… eu era o Mogli, o menino-lobo. Minha mãe tinha de pôr gente pra procurar onde é que esse menino tinha se enfiado lá no Rio Pardo. Meu anjo da guarda não dormia. Eu adorava mexer com cobra, com passarinho, com ovo de passarinho, queria criar coruja. O meu habitat é o habitat natural. Quando fui pra cidade, com 10 anos, comecei a ficar deprimido. A gente se mudou pra Ribeirão Preto porque tinha de ir para uma escola melhor, fazer inglês. Mas eu vinha todo fim de semana e dormia na usina. Minha mãe me deixou uma cama. Eu cozinhava minha comida, fazia tudo. Tinha essa ligação muito forte com a terra.
Aí fui pra cidade fazer faculdade. Mas, no dia que eu pisei aqui de novo, de volta, puf! Era uma coisa que estava bem enraizada desde a infância. E o que eu vivi na infância? Fenomenologia. É uma forma de aprendizado científico, sistematizado e inspirado no Goethe, dramaturgo e novelista. Ele tem cada texto sobre natureza que é um tratado. Ele e Darwin pra mim… você lê um pouquinho e entende tudo. Mas eu sou agrônomo – e foi ótimo ter feito agronomia, ter estudado os venenos. Porque assim eu pude conhecer os dois lados.
Quer mais? Escute abaixo trecho extra da entrevista!
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